Amadeo de Souza Cardoso
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Maria do Rosário Pedreira
PAI,
DIZEM-ME QUE AINDA TE CHAMO…
Pai,
dizem-me que ainda te chamo, às vezes, durante
o
sono – a ausência não te apaga como a bruma
sossega,
ao entardecer, o gume das esquinas. Há nos
meus
sonhos um território suspenso de toda a dor,
um
país de verão aonde não chegam as guinadas da
morte
e todas as conchas da praia trazem pérola. Aí
nos
encontramos, para dizermos um ao outro aquilo
que
pensámos ter, afinal, a vida toda para dizer; aí te
chamo,
quando a luz me cega na lâmina do mar, com
lábios
que se movem como serpentes, mas sem nenhum
ruído
que envenene as palavras: pai, pai. Contam-me
depois
que é deste lado da noite que me ouvem gritar
e
que por isso me libertam bruscamente do cativeiro
escuro
desse sonho. Não sabem
que
o pesadelo é a vida onde já não posso dizer o teu
nome
– porque a memória é uma fogueira dentro
das
mãos e tu onde estás também não me respondes.
Maria do Rosário Pedreira
3 comentários:
Entre a notícia do "sexto sentido" e este poema, fico com o poema.
Se, do programa, tirassem de lá a Lili Caneças, eu escolheria a notícia do "sexto sentido".
E escolheu bem, anónimo. Trata-se de um poema de uma grande intensidade emocional, principalmente para quem já perdeu o progenitor.
Isto, contudo, não desvaloriza a intervenção do segundo anónimo, que alinhou com humor ao meu comentário ao vídeo do "sexto sentido", em que eu referi esse ícone da imprensa cor de rosa, Lili Caneças.
Lili Caneças, que é uma mulher culta e inteligente, devido à sua actividade mundana, presta-se (injustamente, diga-se) a servir de alvo preferido, para quem pretenda ridicularizar a futilidade do vedetismo de uma certa elite social, que gravita à volta da indústria do espectáculo e da moda, e à qual se associam os pelintras brasonados e os pacóvios novos ricos. Lili Caneças movomenta-se muito bem, e em proveito próprio, nesse mundo de idiotas.
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