Quando os governantes da França e da Alemanha, de uma forma leviana, resolveram abrir as hostilidades, dando início à carnificina da I Guerra Mundial, os generais de ambos os lados, que mediam o seu potencial militar pela dimensão dos seus exércitos, acreditavam piamente que o conflito seria resolvido numa questão de três ou quatro semanas. A guerra durou quatro longos anos, com milhões de homens mortos em combate, e no meio de um cenário dantesco, que, antes, nenhum militar previra. O mesmo está a acontecer na União Europeia (UE).
A facilidade com que meia dúzia de políticos e de tecnocratas, obnubilados pelas delícias do pensamento único neoliberal, elaboraram os planos de empréstimos à Grécia, Irlanda e Portugal, impondo-lhes, irracionalmente, ao arrepio de toda a razoabilidade da ciência económica, e num período crítico em que as suas respectivas economias atravessam uma forte recessão, condições draconianas para que, rapidamente, diminuíssem os seus défices orçamentais, leva-nos a concluir que caíram no mesmo erro de avaliação, que traiu os generais franceses e alemães da I Guerra Mundial. Se os generais semearam a morte nas trincheiras, onde os soldados viviam como bichos, os principais dirigentes políticos da UE estão a espalhar o desespero e a miséria pelos três países periféricos, cujos governos não estiveram à altura das suas responsabilidades.
O exemplo da Grécia é paradigmático. Decorrido um ano sobre o início da execução do plano de ajuda, desenhado a preceito pela UE, FMI e BCE, a situação do país piorou, o que está a provocar o nervosismo dos credores da dívida grega (principalmente os bancos alemães) e a criar engulhos nos políticos, que julgavam que a receita era milagrosa. O remédio, em vez de curar, está a matar o doente. Os mercados financeiros já estão a praticar a taxa de juro de 15 por cento e a dívida pública, que representava, há um ano, 115 por cento do PIB anual, passará, no fim de 2011, para 150 por cento. A situação é de tal maneira grave, que os principais dirigentes europeus já admitem a necessidade de reforçar a economia grega com um novo empréstimo, ao abrigo do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF), fundo este constituído pelas contribuições, indexadas aos respectivos PIB, dos outros países do Eurogrupo, o que começa a não ser pacífico, já que alguns países (como é o caso da Finlândia e também o da Grã-Bretanha, que, não sendo do Eurogrupo, também tem de contribuir, tal como os outros países da UE, que se encontram nas mesmas condições), começam a questionar-se sobre a eficácia dos planos de resgate aplicados, ao mesmo tempo que adensam o seu receio de poderem vir a perder o dinheiro que já emprestaram.
As notícias que chegaram da Grécia sobre o agravamento dos indicadores económico-financeiros e sobre o ambiente de ruptura social iminente, que as centenas de motins anunciam, podem precipitar a divisão entre os países da UE, com uns a exigirem o escalonamento da dívida dos países periféricos, ou até a sua saída do espaço do euro, e outros, principalmente, a Alemanha, França e Espanha, cujos respectivos bancos estão mais expostos aos países devedores, a pretenderem evitar a suspensão do actual modelo de ajuda. As reuniões dos países do euro e do conselho europeu, na próxima semana, poderão trazer muitas surpresas negativas.
Foi neste jogo que Portugal alinhou, através dos partidos do arco da traição, cujos respectivos dirigentes, desprovidos de uma qualquer visão estratégica, não souberam avaliar correctamente a fragilidade da UE, aceitando passivamente um acordo, que vai cavar o buraco mais fundo, que a nossa História regista, e que só tem paralelo com a perda da independência nacional em 1580.
Este acordo assinado com a troika é um novo Alcácer-Quibir, já que Portugal perdeu parte da sua independência, ao ter de governar com um programa imposto por estrangeiros. Quando o distanciamento temporal o permitir, não tenho dúvidas que os historiadores do futuro irão apelidar estes dirigentes partidários de coveiros da Pátria.
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