Jerónimo de Sousa levantou, neste final de campanha, o problema do défice orçamental, que este ano e nos próximos se vai agravar, devido à crise económica e financeira, ultrapassando o limite de três por cento do PIB, permitido por Bruxelas, por força do Pacto de Estabilidade.
Quer o PS, quer o PSD omitiram o premente assunto dos seus programas eleitorais e dos seus discursos de campanha, optando antes pelas grandes tiradas retóricas, sem substância e sem conteúdo, ou então, derivando o discurso para o TGV, para a asfixia democrática ou para a culpabilização mútua de políticas passadas.
Neste quadro, onde as campanhas se sustentam da mera propaganda e onde falta a informação concreta sobre as políticas a aplicar, os portugueses vão votar sem saberem o que aqueles dois partidos pensam sobre o combate ao défice, situação, intencionalmente criada, para depois, uma vez no poder, invocarem a ausência de um qualquer compromisso pré-eleitoral, que os tenha vinculado.
Em 2005, José Sócrates também nada disse na campanha eleitoral sobre as políticas que veio a aplicar para reduzir o défice deixado por Guterres, Durão Barroso e Santana Lopes. Não informou os portugueses que iria aumentar o IVA, não informou os portugueses que iria congelar o aumento de salários aos funcionários públicos e as pensões aos reformados, não informou os portugueses de que iria cortar despesas na saúde e na educação, prejudicando o desenvolvimento destes dois pilares importantes em qualquer sociedade civilizada, não informou os portugueses de que iria aumentar as taxas moderadoras, principalmente a dos internamentos, que foram gravosas. Além de ter omitido todas estas premeditadas medidas, que recaíram principalmente na classe média e na população mais desfavorecida, José Sócrates ainda se deu ao luxo de encetar um sem número de reformas, cujo objectivo consistiu numa forçada redução da despesa. Esta visão economicista e redutora conduziu a uma desarticulação de alguns serviços públicos, principalmente aqueles, cuja degradação não foi imediatamente percepcionada pela opinião pública. Foi o que aconteceu, para dar um exemplo, nos hospitais, onde o governo travou o ingresso nos quadros daqueles médicos que terminaram a sua especialização, socorrendo-se de médicos tarefeiros, alugados a empresas, e criando, deste modo, um hiato temporal na continuidade da renovação geracional daquelas unidades de saúde, o que, a longo prazo, vai irreversivelmente prejudicar a eficiência dos serviços.
É certo e sabido que este cenário vai reproduzir-se, com mais ou menos variações, na próxima legislatura, quer seja com Sócrates, que já provou ser socialista nos períodos eleitorais e neoliberal no resto do mandato, quer seja com Manuela Ferreira, que sonha ressuscitar o cavaquismo puro e duro.
Os próximos anos vão ser muito duros para os portugueses, melhor, para os portugueses da classe média e para os mais desfavorecidos. Não havendo margem na economia para aumentar impostos (não há coragem de acabar com o privilégio dos bancos, que só pagam 14 por cento de IRC), o futuro governo irá procurar reduzir o défice pelo lado da despesa. E, pela experiência anterior, já se sabe o que vai acontecer.
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