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domingo, 15 de novembro de 2009

Réplica da crónica dos bons malandros...



Quando os investigadores do processo Face Oculta se aperceberam que, naquela alegre cavaqueira telefónica, o interlocutor de Armando Vara era, nem mais nem menos, o primeiro ministro de Portugal, José Sócrates, não poderiam ter dito, estamos fodidos, é o primeiro ministro, nem sequer poderiam ter interrompido a escuta legal, que estavam fazendo, tal como gostaria o zeloso presidente do Supremo Tribunal da Justiça, e de imediato meter-se na conversa para dizerem, esperem aí seus cabrões, que vamos pedir autorização superior para poder escutar o primeiro ministro, opção esta que lhes pareceu ser a mais correcta, o que os levou, logo de seguida, a procurar o procurador responsável do inquérito, a quem contaram, alarmados ou a espumar de contentamento, não se sabe, o inesperado incidente, insólito como os demais, envolvendo a criatura, já que nunca se tinha visto um primeiro ministro, em perfeito juízo, a prometer favores a um amigo de longa data, mas que, agora, apesar da sua promoção meteórica a vice-presidente do maior banco privado português, depois de ter sido um humilde caixa de balcão do maior banco do país, anda metido em negócios escuros com um célebre sucateiro, que parece estar a corromper quem, no Partido Socialista, se atravesse com sentido de oportunidade no seu caminho e lhe possa facilitar os interesses e a progressão dos seus negócios. O procurador titular e o juiz de instrução, logo ali, depois de também eles terem ouvido o que os inspectores ouviram, mergulharam a fundo no emaranhado código do processo penal, um código de má fama, já que, segundo as más línguas, teria sido feito à medida das necessidades do processo Casa Pia, não fosse dar-se o caso de vir a ser provada inequivocamente a culpa de algum alto dirigente daquele partido dos trabalhadores, perante a brutal acusação de andar a apalpar cus a meninos e a dedicar-se ociosamente à prática da sodomia e do fellatio, e depois do tal mergulho dos magistrados, como se disse anteriormente, a virar e a revirar as folhas do calhamaço, andando da frente para trás e de trás para frente, clamaram triunfantes, o que sossegou os inspectores judiciais, vamos fodê-lo, e, num frenesim, desataram a extrair certidões do processo, destinado à abertura de um outro inquérito autónomo, que enviaram para o chefe máximo da investigação, que é, como se sabe, o Procurador Geral da República, cargo este que, segundo opinou um distinto advogado da nossa praça, e agora bastonário da respectiva corporação representativa, tem tanto poder como tem a raínha de Inglaterra, o que é uma forma eufemística de dizer que não tem poder nenhum, já que o verdadeiro poder da cega justiça se encontra no presidente do Supremo, esse sim, verdadeiro imperador da lei, com poderes excepcionais, até para mandar escutar os detentores dos três mais importantes cargos do Estado, a saber, presidente da República, presidente da Assembleia da República e o primeiro ministro. E o dito presidente, nunca perdendo a pose majestática quando comunica com os portugueses, através de um comunicado, passe o pleonasmo, mas que não consegue fazer um discurso verbal escorreito, quando interpelado pelos jornalistas, ao ponto de já ter entrado no anedotário nacional, aquela sua famosa frase, temos de pensar se não teremos de repensar a investigação judicial, frase esta que diz muito sobre a idiossincrasia do sujeito, disse que não estava para ali virado e num acto a condizer, com o seu estatuto de César, mandou destruir as gravações de todas aquelas escutas telefónicas, sem se dar conta, de tanto pensar e repensar na melhor maneira de foder os magistrados do Ministério Público, por quem ele cultiva um ódio mais maligno e mortal do que o ódio que Sócrates vota aos jornalistas, que estava a mandar destruir provas importantes, respeitantes a um sujeito, já constituído como arguido no processo, e que estava legalmente a ser escutado, o que prova que o dito presidente, tal como Deus, vê o Direito por linhas tortas, preocupando-se mais pelo cumprimento dos formalismos, que a leitura linear dos códigos proporciona, do que pela procura da verdade dos factos, que é a mais nobre missão da Justiça.
Alexandre de Castro

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