Já se percebeu que o governo, submetido aos interesses do grande capital, está a procurar, utilizando uma argumentação falaciosa, recuperar a competitividade da economia, através da desvalorização dos salários. As medidas assumidas nas duas versões do PEC perseguem, de uma formas camuflada, esse objectivo. É certo que, por essa via, seria possível, momentaneamente, ganhar competitividade ao nível das exportações. Mas isso, para além de não contribuir para o desenvolvimento futuro, uma vez que com salários reduzidos o mercado interno definharia, seria sol de pouca dura. Outros países, com níveis salariais inferiores, já estão a perfilar-se para, com vantagem competitiva, concorrerem nos tradicionais mercados externos dos produtos portugueses, realidade que, consequentemente, obrigaria a um novo ciclo de desvalorizações salariais no nosso país, para se manter essa mesma competitividade. A repetirem-se estes ciclos, de desvalorizações sucessivas de salários para alavancar o aumento das exportações, o desenvolvimento da economia ficaria comprometido, já que não haveria estímulo para apostar em força na investigação e na inovação. Com salários tendencialmente a descer, o país ficaria cada vez mais pobre.
O problema central do bloqueio da economia portuguesa explica-se pelo desajustamento do tecido produtivo em relação ao bloco económico em que está inserido, agravado pela falta de empreendedorismo dos empresários portugueses, que se constitui no principal problema da fraca competitividade. Para isso contribuíram factores culturais e históricos. As classes dominantes de Portugal, antigamente a aristocracia e, actualmente, a burguesia, a nova e a velha, enriqueceram à custa da protecção do Estado. A pimenta da Índia, o ouro do Brasil, os escravos de África, o condicionamento das importações durante o regime salazarista e os rios de dinheiro (mal aplicados) da União Europeia formaram, ao longo da história, classes dominantes parasitárias, que, sem qualquer esforço ou engenho, acumularam riquezas desproporcionadas em relação ao seu valor intrínseco. No momento actual, para que se mantenha o mesmo nível de enriquecimento da classe dominante, exige-se que o Estado aumente a carga fiscal do factor trabalho, reduza os direitos sociais e diminua o nível salarial dos trabalhadores. Com esta política suicida, Portugal será cada vez mais um país pobre e sem futuro.
Não admira que, em Portugal, a economia se ressinta da falta de uma visão estratégica de longo prazo, cujo eixo dinamizador assentasse na educação e na aquisição de competências da população. A classe empresarial portuguesa, constituída por cerca de 290 mil indivíduos, tem uma formação académica inferior à dos cinco milhões de trabalhadores que emprega, sendo as suas qualificações muito inferiores às dos seus congéneres espanhóis e europeus (ver quadro).
Nota: Agradeço ao João Grazina a preciosa ajuda no tratamento informático do quadro apresentado neste post.
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