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sexta-feira, 17 de julho de 2009

Uma crise mal explicada (2)


2- Os políticos ao serviço do capital financeiro

Durante o ano de 2008 ocorreu a grande degradação da economia mundial, com o comércio internacional a cair a pique, anunciando o fim de um longo ciclo económico, baseado no petróleo, e o começo de um outro ciclo, baseado nas tecnologias dos transportes verdes e nas energias limpas. Entre o trimestre de Dezembro de 2008 a Fevereiro de 2009 e o trimestre homólogo da ano anterior, de Dezembro de 2007 a Fevereiro de 2008, o comércio internacional caiu 44%. Nesse período assistiu-se, a nível mundial, à destruição do tecido económico, cuja imediata consequência foi o disparo do desemprego, que vai continuar a aumentar.
Esta crise económica não podia deixar de ter consequências no sistema financeiro, tal como ele foi sendo construído ao longo de duas décadas, apostando na economia virtual de base especulativa, o que lhe aumentou a vulnerabilidade e lhe expôs as fragilidades. A falência do banco de investimentos norte-americano, Lehman Brothers, foi a bomba que deu o alarme e iniciou a derrocada. Os bancos americanos perceberam que os incumprimentos crescentes dos crédito ao consumo e do crédito imobiliário tinham um fundamento estrutural e não conjuntural. A contaminação sistémica foi rápida e desastrosa.
Entretanto os governos ocidentais, apanhados de surpresa, por mau cálculo, e, também, por não terem valorizado os sinais de fraqueza que as economias estavam a dar, ficaram paralisados e em pânico. Em Dezembro de 2009, os dirigentes europeus, por exemplo, eclipsaram-se, deixando de se pavonear à frente das câmaras de televisão, como faziam anteriormente. E o medo justificava-se, pois depressa perceberam que o desemprego que se avizinhava era estrutural e que era impossível fazer uma reconversão a curto e a médio prazo, como aconteceria, se o fenómeno fosse conjuntural. O perigo da agitação social incontrolável levantou espectros e fantasmas.
Não reconhecer o primado da crise económica e centrar o discurso no desastre financeiro, apontando o dedo aos bancos, aos especuladores, aos supervisores e às agências de rating, foi o subterfúgio, embora verdadeiro, para alijarem as responsabilidades imediatas e ocultarem o falhanço da economia neoliberal, que eles aplicaram fervorosamente.
E para tentarem salvar-se do naufrágio, a si e aos detentores do capital financeiro, começaram a fazer constar que, resolvida a crise financeira, a recuperação económica, que ainda se agravou mais com a crise financeira, iniciaria o seu caminho, regressando tudo à normalidade. Foi o período, e que ainda continua, de os políticos e as instituições internacionais, FMI, Banco Mundial e Reserva Federal americana, alternadamente dramatizar e desdramatizar a crise, ora anunciando que ela continuava a fazer mossas, ora dizendo que já se bateu no fundo e já se via uma luz no horizonte, numa contradição de termos que levou à suspeição de que estes discursos tinham apenas a finalidade objectiva de acalmar a ansiedade da opinião pública, estupefacta e incrédula, pois o sistema tinha-lhe garantido, anos a fio, a felicidade suprema do céu e, agora, o que se via, era a proximidade das chamas do inferno.
Os governos, desprezando um apoio sustentado aos desempregados, optaram por enterrar dinheiro público nos bancos em dificuldades, para que eles se libertassem dos produtos tóxicos, resultantes do crédito mal parado. Nos Estados Unidos, essa hemorragia dos dinheiros públicos foi verdadeiramente escandalosa. Mas, mais escandaloso ainda, é verificar que esta política se destina a tentar restaurar o mesmo sistema, um sistema com os mesmos vícios e com as mesmas manobras, continuando a manter-se os intocáveis paraísos fiscais, e permitindo que a economia virtual de base especulativa regresse em força para continuar a dar colossais lucros ao capital financeiro. As débeis decisões anunciadas para reforçar a supervisão são meras medidas de cosmética, que rapidamente serão esquecidas.
No entanto, subsiste o problema político, que o desemprego crescente vai provocar. O descontentamento popular poderá desembocar numa agitação social incontrolável, que obrigue à necessária mudança das regras do jogo.
Tudo ainda se encontra no princípio, embora nos andem já a dizer que o fim está para breve.

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