Antes era assim
A laicidade e a não confessionalidade do Estado Português, que se encontram consagradas na Constituição da República Portuguesa, vão sendo paulatinamente corrompidas por decisões governamentais avulsas, em promíscua aliança com a igreja católica.
O que está a acontecer em relação aos professores de Educação Moral e Religiosa constitui mais um episódio dessa conspiração silenciosa, promovida por uma religião que se arvora no direito de, através do ensino público, tentar impor a sua fé e o seu credo, extravasando os limites da sua acção, que deve confinar-se aos espaços religiosos. O secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, através do Despacho Interno Nº 2/SEE/2009 (de 23 Junho), vem permitir que aqueles professores, nomeados pela autoridade eclesiástica, possam leccionar outras disciplinas e ocupar cargos directivos e de gestão escolares, concedendo-lhes assim uma situação de privilégio em relação aos outros professores, que se sujeitaram a concurso público, para entrar e pçrogredir na carreira, e colocando-os em posição vantajosa em relação aos professores de outras confissões religiosas, que não são abrangidos por aquele despacho.
Esta situação escandalosa, já denunciada por várias associações cívicas, vem permitir aos bispos, através dos membros do clero que nomeiem para as escolas, como professores de Religião e Moral, exercer um efectivo poder dentro das escolas, o que viola a Constituição e os superiores valores da República, para além de constituir um grave perigo, quando se tratar de implementar directivas ou aplicar orientações temáticas, como a Educação Sexual, por exemplo, que a igreja católica considera assuntos tabus.
Com esta genuflexão ao episcopado português, um governo, que se proclama socialista, republicano e laico, compra o silêncio e a cumplicidade da igreja católica em relação às cegas políticas sociais e económicas, que aumentaram dramaticamente a pobreza em Portugal, assim evitando o embaraço do seu eventual protesto e da sua eventual crítica, protesto e crítica que têm estado ausentes no discurso dos prelados portugueses.
Devido ao seu interesse, publica-se na íntegra o comunicado da Associação República e Laicidade, que veio a terreiro denunciar esta escandalosa cedência aos interesses da igreja católica, com manifesta violação dos princípios constitucionais da laicidade do Estado.
Comunicado de imprensa:
1. A Associação República e Laicidade condena a escandalosa cedência do Governo às reivindicações da Comissão Episcopal da Educação Cristã, cedência expressa no Despacho Interno Nº2/SEE/2009 (de 23 de Junho), assinado pelo Secretário de Estado da EducaçãoValter Lemos.
2. A Associação República e Laicidade teme que o Ministério da Educação, ao permitir que os professores de Educação Moral e Religiosa Católica possam leccionar outras disciplinas ou áreas curriculares não disciplinares, ou ao tolerar que os professores de Educação Moral e Religiosa Católica possam exercer cargos de Direcção de turma ou de gestão, esteja a permitir também que os alunos que escolhem não frequentar a disciplina de Educação Moral e Religiosa sejam expostos a tentativas de proselitismo, ou a tratamentos de desfavor. É assim atacada a não confessional idade do ensino – garantida no artigo 43º da Constituição da República portuguesa.
3. Agrava-se assim a situação de privilégio dos professores de Educação Moral e Religiosa, que são nomeados por autoridades estranhas ao Estado, e os restantes docentes, que acedem à escola pública por concurso público, reforçando uma situação de desigualdade.
4. Agrava-se também a discriminação positiva dos docentes de Educação Moral e Religiosa Católica face aos de outras confissões religiosas, estes últimos interditados pelo §4 do artigo 24º da Lei da Liberdade Religiosa de «[leccionar] cumulativamente aos mesmos alunos outras áreas disciplinares ou de formação».
5. A Associação República e Laicidade reitera que a Educação Moral e Religiosa não deve ter lugar na escola pública, mesmo enquanto disciplina facultativa. À escola pública compete ensinar a ciência, cultivar o conhecimento, fomentar o pensamento crítico e formar para a cidadania, e não difundir a fé ou impor a crença. O ensino da religião pode perfeitamente ter lugar no âmbito associativo das comunidades religiosas.
Com os meus melhores cumprimentos,
Ricardo Alves(Presidente da Direcção da Associação República e Laicidade)
Lisboa, 28 de Junho de 2009
Associação República e Laicidade
Rua Cidade de Bolama, nº15, 7ºdto.1800-077 Lisboa
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