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quarta-feira, 21 de maio de 2014

No limite do desespero!...


Deixo-vos um dramático depoimento de uma leitora anónima, que foi publicado no espaço dos comentários de um texto meu, no Alpendre da Lua, datado de 21 de Abril, e que pode ser visto aqui.
Foi como se um raio me varasse de alto a baixo, fulminando-me. E toda a raiva que eu senti subiu-me até aos dentes e fez-me doer o peito.
Nunca tinha enfrentado uma situação destas, uma alarmante situação que me confundiu e que me levou ao desencontro comigo mesmo, tal foi o impacto do choque emocional que me abalou. Senti-me perdido no meio do desespero agarrado àquelas palavras de chumbo, que me queimavam a língua. Destroçado pela violência do testemunho e humilhado pela minha impotência, contive o grito de revolta, que me sufocava, chorando por dentro, em silêncio.
Alinhavei a resposta possível, aquela que me pareceu mais oportuna para tentar impedir o fim trágico de uma vida, que está a sucumbir, cedendo ao desalento e anunciando a sua desistência.
Muito gostaria que a esperança pudesse renascer naquele coração que se quer recusar a viver.
Da resposta imediata, que lhe enviei, ainda não obtive qualquer reação. Espero que a leitora anónima apareça por aqui, mais animada.
Alexandre de Castro
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O comentário da leitora anónima

Eu e o meu melhor amigo já fomos empregados decendemente pagos. Ele agora tem de trabalhar 10 a 12 horas por dia, esgotadao e mal ganha para manter a casa. Eu estive desempregada muito tempo e agora voltarei ao desemprego. Sonhei ter uma vida de classe media, decente, ter contas pagas, fazer arte e desporto. Mataram-me. Esperança é uma palavra estupida que eu já não quero ouvir. Não estou a viver. Fiz o mesmo que qualquer Hans noruegues ou Karen sueca ou Gerard suiço. Mereço o mesmo. Dignidade, felicidade. mas não há. Não queremos emigrar queremos viver aqui. Gostamos de viajar mas nunca seremos felizes lá fora. tenho quase 40 anos, sei o que gosto e o que quero. Estudei, trabalhei, anos e anos, no duro. Agora acabou. Estou a tentar as ultimas possibilidades, mas no final deste ano se não ficar resolvido, vou partir. Eu e o meu amigo. Mas não é pra outro país. É para fora deste mundo. Não vale a pena viver. Adeus amigos, coragem, 
19 de Maio 2014
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A minha resposta

Querida amiga anónima:
Fiquei atordoado e muito emocionado com o seu depoimento, que traduz bem o seu desespero, que é também um desespero de todos nós, daqueles que, abnegadamente, dentro das possibilidades de cada um, lutam incansavelmente contra a trágica tirania que se abateu sobre o humilde povo português.
Faço-lhe um veemente apelo para encontrar no mais íntimo de si um fio de coragem e uma centelha de ânimo.
Eu compreendo-a, mas ficaria feliz se, através da minha palavra, conseguisse levá-la a desistir dos seus desesperados intentos e a começar a resistir, lutando. 
Coragem, minha amiga.
AC
20 de Maio 2014

6 comentários:

Ana disse...

Arrepia mesmo. Conseguiram ferir a dignidade do cidadão. Como a compreendo. Muitas vezes, mas por razões diferente, a de me ver confinada a uma cadeira de rodas e a sofrer 24 horas sobre 24.E se consigo mesmo assim manter-me viva, não é pelo dinheiro da aposentação que me abonarem a uma invalidez absoluta. Nem para os medicamentos dava....Tanto trabalhei para o estado. como professora não tinha direito a subsídios como os deputados e os senhores do poder têm. E castigam-me com uns míseros tostões, a quem trabalhou quase três décadas por sair muito antes do tempo para a reforma..e uma triste com Assunção Esteves que tem um balúrdio de pensão e a acumular com o cargo que tem. Também desejo que este casal em desespero encontre uma solução sem ser a que têm em mente. Enfim...é o triste país em que vivemos...

Anónimo disse...

Esperemos, sim, que esta leitora anónima torne a passar por aqui... mesmo anónima... ficamos à espera.

Fico aguardando, também, Alexandre.

Há linhas da frente,que estão disponíveis para ouvir pessoas em desespero...que não conseguindo resolver problemas de fundo, como este, podem dar um humano ouvido para momentos como este. E refiro-me a linhas como Sos Voz Amiga , Voz de Apoio,SOS Estudante, ...
Todos estes números estão disponíveis ou na Internet ou em listas Telefónicas.

(...)

Sónia Micaelo disse...

Carregamos a morte às costas desde o dia em que nascemos. Não tem que ser uma coisa má nem boa, é o que é: uma realidade, que mais cedo ou mais tarde, acontece. Queremos sempre que seja mais tarde, porque enquanto não chega, as possibilidades nunca são as últimas, há sempre mais uma e mais outra. Sei que em muitas fases da vida, não se vive, apenas se sobrevive (como eu sei bem isto!). Sobreviver a uma dessas fases é algo bom, faz com que entremos na próxima fase que pode estar cheia de mais um milhão de possibilidades. Esperança não é uma palavra estúpida, desistir é uma palavra estúpida! Das mais estúpidas que conheço. São tantos os que já nascem mortos à nascença. Desde o primeiro respiro que lhes é negada a oportunidade de uma vida de sonho. Sobrevivem sem nunca terem sido "decentemente pagos" ou nunca terem feito arte ou desporto e qualquer sonho que tenham um dia sonhado, acaba por se dissipar na nuvem da sobrevivência. Ainda assim não desistem! Esse é o verdadeiro milagre da vida: sobreviver, encontrando outros sonhos para sonhar.

Só posso desejar que esta anónima tenha a coragem que aqui deseja, para também ela sobreviver, como tantos de nós o fazemos.

O Puma disse...

Um caso entre tantos
impostos pela canalha
que algum povo insiste em carregar
nas urnas

Abraço amigo

Graza disse...

Querida anónima:

Estava a ouvir a Lágrima, por Dulce Pontes, no momento em que li a teu lancinante desabafo. Proponho-te por isso que a ouças para que tenhas a noção do ambiente em que te li:
http://www.youtube.com/watch?v=QoEZB0XvEZQ

Deixa-me tratar-te assim, por Querida Anónima, porque não é por não te conhecer que não podes passar a ser-me uma pessoa muito querida. Tu podes até nem existir, ser fruto da imaginação de alguém que aqui entrou, e à maneira de Pessoa, jogar com o leitor que aqui caiu, mas tudo na vida é um risco, e este de acreditar que a figura virtual que por enquanto és, é também um risco que corremos ao considerar que existes mesmo e o teu drama é bem real.

Tenho um amigo, que por causa do bem que quis fazer aos pobres e desafortunados da vida, fez da sua vida uma luta mas uma luta tão grande, que acabou passando largos anos na prisão, fora do país, e sofreu os mais bárbaros espancamentos e as mais atrozes das torturas. Ele conta, que em dado momento, o esforço que fazia para não se deixar morrer, só já tinha a ver com o acabar a sua luta com consequência, ou seja, poder testemunhar um dia que existiam seres humanos que faziam aquilo a outros seres só porque tinham pensamentos políticos diferentes. Por muito que lhe custasse manter-se vivo, apostou em sofrer ainda mais para que tivesse valido a pena a sua luta. E garanto-te que valeu, porque foi o livro das suas memórias da prisão que permitiu que aquilo pelo qual não se deixou morrer fosse denunciado e o mundo o tivesse sabido e a justiça esteja a ser feita. Hoje, ainda hoje mesmo, olhei para ele com enorme carinho por saber que teve a coragem de fazer isso, e que respeito eu tenho por ele hoje minha amiga.

Porque é que te conto isto? Não sei bem, mas foi o que me ocorreu enquanto lia o teu desabafo, mas talvez tenha sido a tentativa de mostrar-te como há por vezes motivos bem mais fortes para não deixarmos de lutar. Temos um dia que estar cá todos para ajudar a fazer justiça. O que eles querem é ver-nos desaparecer, e desaparecer é fazê-los ganhar. Temos que resistir. Estamos cá para nos apoiarmos, passamos é muitas vezes ao lado uns dos outros sem sabermos que isso está a acontecer.

Ainda me ecoam nos ouvidos os trinados do fado da Amália, mas quero sobre ele dizer-te que sou eu que estou a cantá-lo e não tu, para que não queiras tirar da letra proveito para ti. Sou eu que canto aquilo.

Um grande abraço para ti. Aparece para combinarmos todos tomar um café à sombra de uma esplanada.

Cidadão do Mundo disse...

Este é caso o que o Alexandre de Castro aqui nos "entrega", generalizar esta situação partilhada não será a melhor atitude de todo..... Esta pessoa, precisará de saber que estamos com ela e alguém escutou o seu apelo, o seu desespero... o Alexandre soube-o fazer e não se sinta com algum "peso" porque não podia fazer mais...... Abraço.