Em cerca de um ano foram
gastos mais de dois mil
milhões de euros em ajustes
directos na Administração
Pública (AP). Este valor é
fornecido através da publicação
de contratos públicos em sites
governamentais e significa
mais de 1,2% do PIB português
(situado nos 163 mil milhões
de euros) que não é sujeito a
concurso público.
Diário de Notícias 2/1/2010
As aquisições pelo Estado de bens imóveis, de bens móveis e de serviços devem obedecer aos princípios de transparência, rigor e racionalidade. Sendo o Estado um conceito demasiado abstracto e os seus servidores pessoas concretas, torna-se necessário acautelar o interesse público, criando mecanismos que assegurem a boa condução dos negócios com o sector privado, prevenindo-se assim o fenómeno da corrupção, do favoritismo e do enriquecimento ilícito. A figura jurídica do concurso público, em que todos os concorrentes se encontram em condições de igualdade, assegura aqueles pressupostos enunciados.
Para obstar a demora na formalização de algumas aquisições, consideradas muito urgentes e importantes, o legislador concebeu a figura jurídica do Ajuste Directo, que permite ultrapassar as formalidades complexas do concurso público. Mas, na tradição do nosso Direito Administrativo, o recurso a esse procedimento expedito é considerado excepção, sendo limitado a uma determinada natureza de bens e serviços de valor pecuniário inferior e condicionado a um limite máximo que, a ser previsivelmente excedido, obrigaria ao recurso do concurso público.
Esta doutrina administrativista foi de certo modo adulterada pelo governo do PS, ao fazer publicar em 2008 um novo Código dos Contratos Públicos, que alarga a malha condicionadora, elevando os tectos máximos dos valores pecuniários dos Ajustes Directos até ao limite do inconcebível, o que leva a afirmar que transformou a excepção em regra. Como argumento justificativo tranquilizador, recorreu ao estafado jargão do interesse público, em que já ninguém acredita.
Abre-se assim na Administração Pública uma frente facilitadora para a corrupção e para o favoritismo, já que, lendo o respectivo código, percebe-se que as medidas cautelares consignadas para a defesa dos interesses do Estado são frouxas, permissivas e, algumas, perfeitamente inócuas.
Com esta nova legislação, é de prever que ao nível dos ministérios, das autarquias e de outras entidades públicas com poder adjudicante comecem a aparecer redes organizadas de funcionários desonestos, colocados em pontos estratégicos, para facilitar aos concorrentes mais generosos o acesso ao contrato por Ajuste Directo, assim como a respectiva adjudicação.
Não é, certamente, com leis deste tipo que se previne a corrupção.
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