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domingo, 12 de junho de 2011

Portugal, século XXI: há escravos levados das Beiras para Espanha


Os novos "negreiros" são famílias que encaminham indigentes para explorações agrícolas espanholas. Dormem acorrentados, passam fome e não recebem.
A imagem de pessoas agrilhoadas, espalhadas pelo chão, espancadas, doentes e famintas remete o imaginário para outros séculos, quando navios sulcavam o Atlântico carregados de negros que, já na América ou na Europa, haveriam de trabalhar como escravos até morrerem. Mas não é aos séculos XVI ou XVII que este relato se refere. Nesta história, não há um oceano pelo meio. Não se salta de continente para continente. Há apenas Portugal e Espanha. Não foi há 300 ou 400 anos. Acontece nos dias de hoje. Há escravos portugueses em Espanha.
PÚBLICO
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Há uns anos atrás, Portugal foi enxovalhado internacionalmente pela denúncia da existência de trabalho infantil. Agora, num retrocesso civilizacional preocupante, surge o espectro da escravatura. O caso denunciado nesta notícia, escrita com muita emoção pelo jornalista José Bento Amaro, não será provavelmente um caso isolado. Fica a suspeita da existência de uma autêntica indústria do esclavagismo, mergulhada na clandestinidade, a proliferar, numa grandeza inversamente proporcional à da pobreza existente no interior do país. O escândalo não pode ser maior. Em pleno século XXI, um país que já foi um bom aluno da União Europeia, e que pretende apresentar-se ao mundo como um país desenvolvido e civilizado, pratica, ainda que marginalmente, a escravatura.
Não vale a pena avançar com a desculpa de que é um fenómeno isolado, marginal ou ocasional, a não merecer a devida atenção das autoridades. Neste tipo de crimes, assim como nos que respeitam ao tráfego de droga e ao tráfego de seres humanos, à justiça apenas chega uma percentagem ínfima de casos. E a condenação dos criminosos, em juízo, já não vem anular o sofrimento, entretanto vivido pelas vítimas.  Compete ao Estado promover medidas pró-activas, quer no domínio da vigilância policial, quer na sinalização dos jovens em risco, numa acção conjugada da Segurança Social com as autarquias. As juntas de freguesia, beneficiando do efeito de proximidade, poderão constituir-se num elemento institucional importante para desenvolver esta tarefa, assim como as ONG e as instituições de solidariedade social. A grave crise económica em que o país está a mergulhar vai promover o aumento desta hedionda prática criminosa, já que a miséria é o terreno fértil para o aparecimento dos negócios marginais. E tal como é preconizado para a prevenção dos incêndios nas florestas, neste caso, também é necessário limpar previamente as matas, antes que chegue o calor do Verão. 

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