Infante D. Pedro |
Carta enviada de Bruges, pelo
Infante
D. Pedro a D. Duarte, em 1426,
resumo feito por Robert
Ricard
e constante do seu estudo
«L’Infant D. Pedro de Portugal
et “O Livro da Virtuosa
Bemfeitoria”»,
in Bulletin des Études
Portugaises,
do Institut Français au Portugal,
Nova série, tomo XVII, 1953, pp.
10-11).
«O governo do Estado deve basear-se nas quatro
virtudes cardeais e, sob esse ponto de vista, a situação de Portugal não é
satisfatória. A força reside em parte na população; é pois preciso evitar o
despovoamento, diminuindo os tributos que pesam sobre o povo. Impõem-se medidas
que travem a diminuição do número de cavalos e de armas. É preciso assegurar um
salário fixo e decente aos coudéis, a fim de se evitarem os abusos que eles
cometem para assegurar a sua subsistência. É necessário igualmente diminuir o número
de dias de trabalho gratuito que o povo tem de assegurar, e agir de tal forma
que o reino se abasteça suficientemente de víveres e de armas; uma viagem de
inspeção, atenta a estes aspetos, deveria na realidade fazer-se de dois em dois
anos. A justiça só parece reinar em Portugal no coração do Rei [D. João I] e de
D. Duarte; e dá ideia que de lá não sai, porque se assim não fosse aqueles que
têm por encargo administrá-la comportar-se-iam mais honestamente. A justiça
deve dar a cada qual aquilo que lhe é devido, e dar-lho sem delonga. É
principalmente deste último ponto de vista que as coisas deixam a desejar: o
grande mal está na lentidão da justiça. Quanto à temperança, devemos confiar
sobretudo na ação do clero, mas ele [o Infante D. Pedro] tem a impressão de que
a situação em Portugal é melhor do que a dos países estrangeiros que visitou.
Enfim, um dos erros que lesam a prudência é o número exagerado das pessoas que
fazem parte da casa do Rei e da dos príncipes. De onde decorrem as despesas
exageradas que recaem sobre o povo, sob a forma de impostos e de requisições de
animais. Acresce que toda a gente ambiciona viver na Corte, sem outra forma de
ofício.»
Amabilidade
de João Fráguas
***«»***
Amigo João:
O Infante D. Pedro foi um dos vultos mais
brilhantes da História de Portugal. Os seus ensinamentos, para que Portugal
saísse definitivamente do modelo de desenvolvimento da Idade Média, em que
dominava a nova e a velha aristocracia, ambas esclerosadas, e se transformasse num
Estado moderno, baseado na força do trabalho e na capacidade de iniciativa da
nascente burguesia comercial, que reclamava direitos e reformas e uma Justiça
mais equitativa, foi, depois, prosseguida com êxito, pelo seu sobrinho-neto, D.
João II, outro vulto gigantesco da nossa História - um estadista de uma grande
astúcia e possuidor de uma visão política rara.
Um e outro encabeçaram o que hoje se chama de
forças progressistas, e que só vieram a ter continuidade efetiva, passados uns
séculos, com o Marquês do Pombal (no Iluminismo), com Mouzinho da Silveira (no
Liberalismo) e com Afonso Costa (na República).
Os restantes estadistas rastejaram pela vulgar mediania
ou pela grosseira e desprezível mediocridade.
Um abraço,
Alexandre
4 comentários:
Caro Alexandre.
Lamento dizê-lo mas não concordo nada com a apreciação feita ao que diz tão bem D. Pedro. Antes pelo contrário, pois estava a dar uma reprimenda a uma certa burguesia materialista e esbanjadora, tal como hoje, que não tinha "berço", que tinha ascendido recentemente ao Poder sem qualquer bases éticas e só se preocupava com ela própria sem respeitar o bem-comum e o bem-publico.
Meus cumprimentos, Lourenço de Almada
Caro Lourenço de Almada:
Não estou de acordo com a sua leitura. O Infante D. Pedro foi a cabeça do partido do progresso, na sua luta política, que haveria de se prolongar durante todo aquele século, o século XV, contra a aristocracia chefiada pelo seu meio-irmão, o conde D. Afonso, genro de D. Nuno Álvares Pereira, e que tinha um grande poder senhorial. E nessa luta, D. Pedro apoiou-se na burguesia das cidades marítimas, Lisboa e Porto, que era a classe que fazia mover a economia. A classe senhorial, possuidora de muitas terras e detentora, por outorga real,de muitos poderes soberanos, pretendia manter o sistema feudal das suseranias. Leia a Breve História de Portugal, do historiador A. H. de Oliveira Marques, a partir da página 118, e verá que não tem razão.
Caro Lourenço Almada:
Por lapso, não deixei os meus cumprimentos, nem formulei os meus agradecimentos, pelo seu comentário.
Alexandre de Castro
Para esclarecer uma leitora, transcrevo aqui o comentário, que escrevi num outro sítio:
"Os méritos das Descobertas, para além do Equador, devem-se ao génio e tenacidade do grande estadista, o Príncipe Perfeito, D. João II. D. Manuel acabou por recolher os seus efeitos. D. Manuel era um homem medíocre. Era irmão da mulher de João II, e, no seu reinado, acabou por restaurar os poderes da nobreza, que D. João II tinha rechaçado, confiscando e extinguindo o ducado de Bragança (da linha genealógica de D. Nuno Álvares Pereira e do seu genro e sucessor, o conde D. Afonso) e o ducado de Viseu, da família da Rainha. Com D. Manuel, consumou-se o triunfo das forças políticas conservadoras, representadas pela alta nobreza, que D. João II venceu com astúcia e determinação. D. Manuel até foi um rei perdulário, que não soube conceber e aplicar políticas de desenvolvimento do Reino, com a imensa riqueza da Índia. Preferiu ser um comerciante da pimenta. Jocosamente, nas cortes europeias, ele era conhecido por Rei da Pimenta, ilustrando-se assim a sua natureza de novo-rico. Os grandes privilégios concedidos por ele à alta nobreza e ao clero, e que foram aprofundados pelo seu filho, o beato D. João III, só seriam liquidados três séculos depois, com o triunfo do Liberalismo, na revolução de 1820, e com a implantação da República, em 1910. Portugal foi governado pelas forças obscurantistas, durante a maior parte da sua existência, a partir da época imperial. Daí o seu atraso económico, social e cultural, em relação a uma Europa que soube fazer a Reforma (Portugal alinhou com as forças da Contra-Reforma) e abraçou os princípios da Revolução Francesa".
Enviar um comentário