A
eurofagia
O conceito de eurofagia, recentemente
introduzido no léxico da economia política, explica, de certa forma, muito do
que atualmente está a acontecer na Europa, principalmente nos países da zona da
moeda única. A palavra, que não consta ainda no léxico do português, tem uma etimologia imediata e intuitiva. Significa
autofagia da economia da zona euro, que aqui também poderá ser utilizada para
compreender o estado da economia de toda a União Europeia. E esta autofagia é
uma das principais causas da atual estagnação económica dos países europeus,
cujo crescimento do passado recente se baseou maioritariamente nas trocas
comerciais intercomunitárias, desperdiçando-se, por uma inércia anunciadora da
sua inevitável decadência, as oportunidades oferecidas pela globalização dos
últimos vinte anos. E, nessas trocas, tem de haver sempre países que ganham, os
que exportam mais, e os que perdem, os que importam mais. Os países do norte
ganharam, principalmente a Alemanha, e os países da periferia perderam, como
foi o caso de Portugal. Só que essa zona do conforto para os países ricos
acabou, tal como as estatísticas e as previsões económicas, principalmente na
Alemanha França e Itália e Espanha, estão a demonstrar. A deflação ameaça
aqueles quatro países, e uma vez instalada a deflação, e tal como está a
acontecer à economia japonesa, torna-se muito difícil sair dela.
Pode pois dizer-se que os países da zona euro
foram preguiçosos, porque se acomodaram à facilidade de fazer trocas comerciais
entre si, num mercado com pouco risco e altamente garantido, mas que não evitou
o avanço da lenta e progressiva invasão das exportações dos países emergentes,
que, gradualmente, foram ganhando quota de mercado no espaço europeu. Vejamos
só dois casos diferenciados, um país que ganhou e outro que perdeu, nestas
trocas intercomunitárias. Na Alemanha, sessenta por cento das suas exportações
são para os países europeus, e Portugal tem, como principal destino das suas
exportações, a Alemanha, a França e a Espanha. Atualmente, a Alemanha, que no
fim do século passado vendia a maquinaria para a China construir as suas
fábricas, já está a sofrer a concorrência, nos seus mercados tradicionais, das
máquinas construídas e exportadas pelo gigante asático, que são muito mais baratas. Nas
lojas dos chineses compra-se uma máquina elétrica de cortar o cabeço por metade do preço da de
uma máquina similar, fabricada em Itália. Portugal, que tentou vencer esta
dependência das suas exportações em relação aos três países atrás citados, tem
tido muitas dificuldades em diversificar as suas exportações para outros
espaços, e isto porque falta à maioria dos nossos empresários ousadia,
conhecimento e clarividência, e também capital. Foram muitos anos a viverem num
espaço protegido, o do Portugal continental e o dos territórios ultramarinos, Não era necessário inovar,
formar e arriscar, porque as vendas e os lucros estavam garantidos. Foi o
período da autofagia lusitana, embora o PIB tivesse crescido, mas não acompanhando
o crescimento verificado no conjunto dos países europeus. Com a adesão à União
Europeia e ao euro, o esforço a fazer também não era muito, porque as fronteiras
aduaneiras da Europa foram abertas. Mas essas mesmas fronteiras abriram-se
também à exportação do capital, através da especulação financeira, empobrecendo
o país, porque esse capital fazia falta para o investimento nacional.
Como as perpetivas dos países europeus, de não
conseguirem crescer para o exterior do seu espaço (1), são diminutas, eles vão
continuar a comer-se uns aos outros, até os mais fracos serem devorados. É uma
consequência natural da economia eurofágica.
Alexandre de Castro
***«»***
(1) A Comissão Europeia revê assim em baixa as
previsões para estes três países [Espanha, França e Alemanha] e confirma também o modesto crescimento que se
espera para a zona euro no próximo ano: no total, os países da moeda única
deverão registar um crescimento médio de 1,1%.
Os ‘nuestros hermanos’ são, ainda assim, quem se
encontra em melhores condições. Bruxelas baixou a previsão em quatro pontos
decimais, para os 1,7%, um crescimento superior ao previsto para a Alemanha
(menos nove casas decimais, para os 1,1%) e França (menos oito pontos decimais,
para os 0,7%). Já em Portugal, a revisão de Bruxelas foi de dois pontos
decimais. O crescimento esperado é agora de 1,3%.
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2 comentários:
E que consequência desastrosa, mas nada de estranho. Já não há nada que me surpreenda.....
A situação da Europa está muito complicada.. Julgo que os governos estão a perder o controlo político da economia, a tal ponto que começa a erguer-se um novo poder decisório na Europa, o poder do BCE, dirigido por Mário Draghi, um homem vindo do banco Goldman Sachs, o banco que fornece os secretários do Tesouro aos governos dos EUA. Trata-se, pois, de uma intervenção direta da alta finança na política europeia.
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