«Joseph Stiglitz: «Será o fim do
neoliberalismo?»
«O mundo não tem poupado o
neo-liberalismo, esse amálgama de ideias que tem por base a noção
fundamentalista de que os mercados se auto-corrigem, aplicam recursos de forma
eficiente e servem devidamente os interesses do público. Foi este
fundamentalismo de mercado que esteve na génese do “thatcherismo”, da
“reaganomics” e do chamado “Consenso de Washington”, que privilegiou a
privatização, a liberalização e os bancos centrais independentes focalizados
apenas na inflação.
Os países em desenvolvimento
têm-se digladiado entre si nos últimos 25 anos e o resultado dessa luta é hoje
claro. Os países que adoptaram políticas neo-liberais são os grandes
derrotados. E por duas razões. Primeiro, não souberam tirar partido do
crescimento. Segundo, quando cresceram de facto, os benefícios ficaram
essencialmente nas mãos dos que ocupam o topo da pirâmide.
Por muito que os neo-liberais não
queiram admiti-lo, a verdade é que a sua ideologia chumbou ainda noutro teste.
Ninguém pode dizer que os mercados financeiros tenham feito um excelente
trabalho no final da década de 90. Mas produziu, apesar de tudo, alguns efeitos
positivos, como a descida dos custos de comunicação, que resultou numa maior
integração da China e da Índia na economia global.
(...)
Os defensores do fundamentalismo
de mercado querem agora que os erros do mercado sejam vistos como erros de
governo. Um delegado do governo chinês colocou o dedo na ferida: os EUA deviam
ter feito mais para ajudar os norte-americanos com rendimentos mais baixos a
gerir melhor o problema do crédito hipotecário à habitação. Estou plenamente de
acordo, mas isso não altera os factos: os bancos norte-americanos geriram
especialmente mal o risco e essa má gestão tem consequências globais. Mas a
injustiça é ainda maior quando se sabe que, apesar dos erros, os gestores
dessas instituições saíram airosamente e com indemnizações milionárias.
Actualmente, existe uma grande
disparidade entre os retornos sociais e os retornos privados. Se não forem
alinhados, o sistema de mercado nunca poderá funcionar bem. O neo-liberalismo
foi sempre uma doutrina política ao serviço de certos interesses e nunca se
fundamentou em teorias económicas. (...)»
Joseph Stiglitz
Diário
Económico
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