"O que está em causa não é o pensamento económico
em si, o qual se considera relevante e indispensável para a melhor compreensão
da realidade societal e do lugar que nela ocupa a organização e o funcionamento
da respectiva economia; tão pouco se põe em dúvida o papel coadjuvante que a
Ciência Económica pode ter na definição de estratégias e medidas de política
que viabilizem e promovam um desenvolvimento sustentável ao serviço do
bem-estar colectivo e da qualidade de vida das pessoas, da coesão e da paz social,
finalidades indissociáveis de uma democracia autêntica.
O que está em causa é que a Ciência Económica
dominante se deixou capturar pelos interesses do capital financeiro e vem
harmonizando as suas lógicas de construção científica com esses interesses,
concentrando aí o seu olhar e o aperfeiçoamento das suas ferramentas analíticas
e, do mesmo passo, desviando-se de outras hermenêuticas que privilegiem, por
exemplo, a satisfação das necessidades das pessoas e do emprego dos respectivos
recursos individuais e colectivos, a prossecução de finalidades de bem-estar individual
e social, a equidade no acesso e na repartição do desapiedados bens, os processos de um
desenvolvimento sustentável.
Nesta deriva ideológica, que, nas três últimas
décadas, se tem vindo a impor, incluindo no meio académico, sob a capa de um
pensamento único com pretensa validação científica, sobressaem a lógica de um
comportamento dito “racional” baseado no mero interesse individual egoísta, a
exaltação do mercado como regulador único do conflito de interesses, a
competitividade como motor de um crescimento económico ilimitado".
Do discurso na cerimónia do seu Doutoramento
Honoris Causa,
pela Universidade Técnica de Lisboa (ISEG)
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Uma reflexão de uma brilhante e insuspeita
académica (situa-se nas correntes de pensamento do catolicismo progressista),
que deverá ser compreendida por todos, nestes conturbados tempos de desvario “austeritário”,
que emanou naturalmente de uma comprometida teoria económica, que já se
transformou em ideologia omnipotente do capitalismo financeiro, ancorando-se na
sacralização do mercado, e na “financeirização” da economia, e que, tendencialmente, caminha para um totalitarismo desapiedado e fascizante.