Esta campanha eleitoral foi paupérrima. Foi a
campanha mais pobre da nossa democracia. Foi uma campanha sem mérito. Eu até me
atrevo a dizer mais: foi uma campanha vergonhosa, porque se cingiu ao remoque,
ao ataque pessoal e à criação de slogans.
Para acentuar este empobrecimento, apareceram pela primeira vez as sondagens
diárias dos jornais e televisões, sondagens com metodologias duvidosas e,
algumas, suspeição minha, bastante tendenciosas.
Por mérito do PàF e desmérito do PS, não se
discutiu convenientemente a governação dos últimos quatro anos, os quatro anos
mais dolorosos para milhões de portugueses, que se confrontaram com medidas
brutais, aplicadas sobre os seus rendimentos. Desempregados, funcionários
públicos e reformados e pensionistas foram esbulhados sem dó e piedade e
equiparados a párias. Os jovens, pela primeira vez, engrossam os números
assustadores do desemprego de longa duração, dando origem ao que já se chama a
geração perdida.
Ao nível das políticas sociais, o governo de
coligação esmerou-se criativamente e cirurgicamente no desmantelamento do
Estado Social. O sector da saúde sofreu cortes monumentais, que levaram ao
encerramento de serviços em hospitais e de centros de saúde. Os entraves à
colocação de Médicos de Família, para substituir os que iam reformando-se, e o
congelamento de concursos para as diferentes especialidades hospitalares
provocaram longas listas de espera para obter a marcação de uma consulta, de um
meio auxiliar de diagnóstico ou de uma intervenção cirúrgica.
Também se passou por cima, retirando os temas da
discussão pública, do elevado nível de endividamento público, que este governo
colocou em 130 por cento do PIB, quando em 2010 era de 90 por cento, e do
défice orçamental, que este ano, segundo as projecções de uma instituição pública,
vai regressar ao nível do obtido em 2010. E os dirigentes da coligação
governamental continuaram a dizer que o país está melhor, o que é uma mentira.
E muito mais haveria para dizer. Só me espanta, caso as sondagens venham a
reflectir a realidade dos resultados das eleições, que as principais vítimas
desta desastrada e criminosa política, de uma direita troglodita, venham a
votar nos seus carrascos.
O Partido Socialista, por incapacidade própria
do seu programa, muito difuso e pouco transparente, e também por incapacidade do seu líder,
que apenas ganhou em termos de simpatia, não se apresentou bem preparado para a
alternância, que não é a mesma coisa do que a alternativa. As pessoas
perceberam que - no aspecto fundamental, que, neste momento, se coloca, a
discussão da nossa complicada relação com a Europa, que nos escraviza - a
posição do PS não era diferente da posição da direita. António Costa empurrou
com a barriga esse problema para as instituições europeias, que já mandam em
tudo, e para uma ação comum, concertada com os partidos europeus da sua família
política. Proposta enganadora. Todos nós assistimos ao seu vergonhoso
comportamento na questão da Grécia. Subscreveram a dura posição da Alemanha e a
dos outros países ricos.
Resta falar da CDU e do Bloco de Esquerda. A CDU
mantém-se firme nos seus princípios de pugnar por políticas de desenvolvimento
económico, em que o Estado tem de intervir activamente, ao mesmo tempo que
defende o fim da austeridade e o reforço de uma economia ao serviço de todos os
portugueses. E, no seu programa e no seu discurso, não se esqueceu da necessidade
de Portugal libertar-se do colete de forças da Europa, que é, neste momento, o
principal problema estrutural da política e da economia do país.
O Bloco de Esquerda alinha com esta ideia, mas
eu não me posso esquecer que a Catarina Martins foi oferecer-se ao António
Costa, sem ele a ter chamado, afirmando que deixava marcado um encontro com ele
no dia seguinte ao das eleições, caso ele as ganhasse. Eu sei que o vinho se
mistura com a água, mas também sei que a água não se mistura com o azeite.
Uma palavra final sobre as sondagens, que constituíram
um grande negócio para as empresas dos jornais e das televisões. Sem terem sido
auditadas por nenhum organismo credível, é legítimo suspeitar dos seus métodos
de recolha de dados e do respectivo tratamento dos resultados. Nessas
sondagens, manteve-se ao longo da campanha, por coincidência ou não, uma
situação de empate técnico entre o PS e o PàF, que era a situação mais favorável
para o negócio, uma vez que iria espicaçar a curiosidade do público para os
resultados das sondagens do dia seguinte. Não acredito em bruxas, mas acredito
que elas existem, como me ensinou a minha avó.
De qualquer forma, e isto é o aspecto mais
grave, elas acabaram por influenciar o eleitorado. E o trabalho que se espera
da comunicação social não é influenciar, mas esclarecer com isenção. Perante a
força mediática, que a comunicação social estava a ter na agenda política da
campanha, os políticos do PS e do PàF começaram a especializar-se na troca de
piropos e na construção de um discurso metafórico, que era isso que os jornais
e as televisões pretendiam, a fim de ganhar audiências. Neste aspecto, a
comunicação social prestou um mau serviço ao país, que irá ficar na História,
porque não abriu espaço suficiente para se discutirem as propostas e as ideias,
preferindo fazer da campanha um espectáculo de boxe, mantendo em aberto a
expectativa de quem venceria por KO.
2 comentários:
Será que vão votar em sondagens?
Consta que nas próximas eleições já não são os partidos a escolher os candidatos. Serão os jornais e as televisões.
Mas também já anda no ar a ideia de se ensaiar um outro modelo para a votação. A fim de evitar o incómodo de o eleitor ter de se dirigir ao local onde funciona a assembleia eleitoral e, também, para tentar reduzir as elevadas taxas de abstenção, a votação será feita, no Domingo aprazado, através de um telefonema (com valor acrescentado) para os programas matinais de entretenimento das televisões, que, no final da votação,além de realizarem um sorteio de um automóvel topo de gama,comunicarão os respectivos resultados eleitorais.Isto, seguindo aquela ideia peregrina de que os privados sabem gerir melhor as coisas do que o Estado.
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