7.10.15
Mestres
dos disfarces
Quando foi repetidamente afirmado, até por diretores do FMI, que as intervenções da Troika na Europa
do Sul foram concebidas de forma a salvar, não os países, mas os bancos
alemães, muitos foram os que não acreditaram ou encolheram os ombros: pois os
alemães, os rectos, honestos, diligentes alemães seriam lá capazes de tal vil
manipulação? O problema está, tinha que estar — como sempre — na preguiça, nos
gastos desregulados, na incompetência, dos que vivem junto das praias quentes
do sul. De Berlim, só pode vir a probidade, o rigor e a retidão. Sabe-se agora que o custo total da fraude da
Volkswagen poderá ultrapassar os cem mil milhões de euros, e que o custo
económico real será várias vezes esse valor. Os rectos, honestos, diligentes,
alemães fizeram algumas vis manipulações, em larga escala e com uma significativa rede de cumplicidades, neste caso,
afinal. Wolfgang Münchau, do Financial Times, antevê: «a minha
expectativa é que a VW seja mantida viva através de alguma combinação de ajudas
ocultas ou visíveis por parte do estado.» Assim como já fomos chamados a salvar
os bancos alemães, resta-nos saber quanto é que nos cabe na fatura das ajudas
ocultas à indústria automóvel germânica. Ela chegará, não duvidemos, como a
anterior. Só resta saber quando — e quanto.
[O título inspira-se num poema de Charles Simic, que nada tem que ver com
este assunto, felizmente.]
Amabilidade
de João Fráguas
***«»***
Amigo João:
Não tenho dúvidas que o governo alemão irá
encontrar um oculto e sofisticado esquema para pôr os contribuintes a
pagar os prejuízos da VW. Quando as pessoas começarem a perceber esse
esquema, já, há muito tempo, estarão a pagar a conta, para salvar a Pátria. Foi
o que aconteceu com a dívida soberana dos países do sul, cujo esquema eu também
denunciei no meu blogue, em 2013. O problema era dos bancos alemães, que iriam
para a bancarrota, devido aos sucessivos incumprimentos da enorme dívida, contraída
pelos bancos portugueses e gregos, que por sua vez endividaram as famílias dos
seus respectivos países, para adquirirem casas de habitação própria.
A gigantesca bolha imobiliária, que se foi gerando ao longo dos anos e que enriqueceu os accionistas dos bancos, foi mantida no
segredo dos deuses e o ministro das Finanças da Alemanha encarregou-se de gizar
o respectivo plano de salvamento, que o directório de Bruxelas engenhosamente pôs em prática. O objectivo
consistia em transferir as dívidas dos bancos de cada país para a dívida
soberana dos respectivos Estados. Activou-se o cerco aos países do sul (os mais fracos no xadrez europeu), pondo as
agências de rating a provocar nos
mercados financeiros a subida especulativa dos juros da dívida soberana de cada
país, que em Portugal era de 90 por cento do PIB, e pressionaram os governos
dos países visados (Portugal e Grécia) a pedirem ajuda externa. Foi uma grande
armadilha. A austeridade imposta aos contribuintes está a gerar receitas através
do pagamento dos juros e das amortizações ao FMI, BCE e comissão europeia, que,
por sua vez, através do esquema da recapitalização bancária, via BCE, fazem chegar o
dinheiro aos bancos alemães, que desta forma podem limpar, com custos reduzidos, os títulos tóxicos em
seu poder. A operação de limpeza destes títulos tóxicos, por parte dos bancos
alemães, deverá ficar concluída em 2018. No entanto, Portugal ficará pendurado
numa colossal dívida, que só acabará de liquidar (o que é impossível) em meados
da década de trinta.
É pois a austeridade que vai pagar os prejuízos
dos bancos alemães, que, anteriormente, com a especulação imobiliária, geraram lucros milionários para os seus accionistas. Explicar isto às pessoas é muito difícil. Os jornais e as
televisões não abordam este esquema fraudulento, omitindo-o do espaço de
opinião e do espaço noticioso e, na campanha eleitoral, o assunto não esteve na
agenda.
Um abraço,
Alexandre
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