40 anos
após Novembro _ a minha memória em carta a um amigo
Amigo João:
Nessa noite, o toque a recolher das bandeiras
foi dramático. Estive em Monsanto e ouvi os tiros da tropa do Jaime Neves. Mas
eu julgo que houve sensatez da parte do saudoso Álvaro Cunhal, que se apercebeu
da desproporção das forças em presença, quando esteve reunido com Melo Antunes,
na casa de Bredorote dos Santos, que promoveu esse encontro histórico. Perderíamos a guerra, se
ela se tivesse desencadeado. E se as forças militares, comandadas pelo Eanes,
não fossem suficientes, os americanos invadiriam Portugal, a rogo de Mário
Soares. Estava tudo combinado, e seria um mar de sangue.
Gorbachov, delegado da URSS ao Congrsso do PCP,
no Porto, poucos meses antes, foi bem claro, quando afirmou, no seu discurso,
que a URSS não estava interessada em arrastar Portugal para a Guerra Fria.
Nessas condições, era difícil vencer qualquer conflito militar. E só quinze
anos depois, quando vi Gorbachov a abdicar do poder, é que percebi a razão por
que a URSS não ajudou as forças revolucionárias portuguesas. Já não podia! E
não podia porque a sua economia, sempre boicotada pelo Ocidente, começara a entrar em crise, porque já não
aguentava o peso (improdutivo, mas necessário) da sua enorme indústria militar.
Esta é a verdade que não podemos ignorar.
Chegámos tarde a uma revolução que teria sido vitoriosa, se tivesse ocorrido em
1960.
4 comentários:
Excelente testemunho
Abraço
Obrigado, Puma.
Amigo João:
Sim, não vale a pena chorar sobre o leite derramado. O 25 de Novembro já passou à história e é uma data para esquecer e nunca para comemorar, como pretendia a direita. A recusa firme dos partidos de esquerda, de terem recusado associar-se à palhaçada, que os partidos da direita queriam montar na Assembleia da República, gostaria de a interpretar como um anúncio prometedor de um novo tempo de mudança. No entanto, não queria deixar de dizer que mantenho a minha opinião sobre o grande desequilíbrio das forças em presença, uma vez que, à época, eu tinha fontes privilegiadas sobre os meandros em que se movimentada o MFA. Eu tinha acabado de regressar de Moçabique, onde cumpri o meu segundo serviço militar obrigatório, como capitão miliciano. Aí (eu estava no Quartel General, em Nanpula) conheci muitos oficiais, que mais tarde vim encontrar em Lisboa, e que me passaram muitas informações sobre o que se passava no Exército. Todos eles, os da minha cor política, me disseram que era impossível vencer as forças contra revolucionárias. E isto, porque não havia um comando centralizado das forças revolucionárias militares., O COPCON era um mito, caracterizado por uma grande ambiguidade. Na realidade, o Otelo desaparecia, sempre que havia alguma borrasca. A história do COPCON ainda não foi bem contada
[Comentário corrigido]
Sim, não vale a pena chorar sobre o leite derramado. O 25 de Novembro já passou à história e é uma data para esquecer e nunca para comemorar, como pretendia a direita. A posição firme dos partidos de esquerda, de terem recusado associar-se à palhaçada, que os partidos da direita queriam montar na Assembleia da República, gostaria de a interpretar como um anúncio prometedor de um novo tempo de mudança. No entanto, não queria deixar de dizer que mantenho a minha opinião sobre o grande desequilíbrio das forças em presença, uma vez que, à época, eu tinha fontes privilegiadas sobre os meandros em que se movimentada o MFA. Eu tinha acabado de regressar de Moçambique, onde cumpri o meu segundo serviço militar obrigatório, como capitão miliciano. Aí (eu estava no Quartel General, em Nampula) conheci muitos oficiais, que mais tarde vim encontrar em Lisboa, e que me passaram muitas informações sobre o que se passava no Exército. Todos eles, os da minha cor política, me disseram que era impossível vencer as forças contra revolucionárias. E isto, porque não havia um comando centralizado das forças revolucionárias militares., O COPCON era um mito, caracterizado por uma grande ambiguidade. Na realidade, o Otelo desaparecia, sempre que havia alguma borrasca. A história do COPCON ainda não foi bem contada.
Um abraço.
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