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quarta-feira, 11 de abril de 2018

A bivalência da coisa




A bivalência da coisa

Era de prever este golpe. Na altura em que Centeno tomou posse, como presidente do Eurogrupo, eu escrevi uma coisa, mais ou menos assim:

"Como é que Centeno vai conciliar o seu discurso em Bruxelas com o discurso do Terreiro do Paço"? Passados uns dias, cheguei à conclusão que o próprio António Costa estava na mesma onda, a jogar na mesma ambiguidade. E, na realidade, nesta metade do mandato, Centeno e Costa entregaram-se à tarefa de fazer um número de ilusionismo, dando por um lado e tirando por outro lado. Designei o governo, como o governo do “tira e põe”.

Só que, os profissionais da Saúde resolveram partir a loiça, fazendo um grande estardalhaço, e ponde a nu as carências e os graves problemas do sector, que só poderão ser resolvidos com uma inversão da política que o governo está a seguir, de inteira submissão a Bruxelas, e, política esta, que não vai mudar, como já se percebeu, limitando-se apenas, e mais uma vez, a ir tapar buracos com provisórios remendos, a fim de calar as vozes dissonantes.

Com o PCP a afirmar que vai ser crítico, mas que não quer a ruptura e um BE, que anda um pouco desorientado para encontrar uma estratégia para resolver este dilema, e, também, com um PSD fragilizado (e que fique muitos anos assim), António Costa pode fazer a política que Bruxelas e Berlim apoiam e pretendem. Com as próximas eleições no papo, o próximo mandato governamental será cada vez mais europeísta, continuando a governar-se à volta da centralidade do défice, e da dívida, dívida que nunca poderemos pagar, a não ser que Portugal venha a ser o Benim da Europa, depois de perder a maior parte de tudo que ganhou no passado.

Já me chamaram “pessimista doentio”, mas eu julgo que tenho razão. Armadilhado com o euro e com a dívida, Portugal não vai ter o futuro, mil vezes prometido. E não sei, até, se poderá continuar a ser um país viável.

E na minha avenida, em Lisboa, vejo cada vez mais pedintes e pessoas a dormir, debaixo dos alpendres, o que, à semelhança do que aconteceu no passado, é, para mim, um sinal premonitório da crise, que vem aí.

Nem a santa de Fátima nos salvará.

Alexandre de Castro
2018 04 10