Referendar
a Europa
Começa
a ser evidente que o sentimento de pertença à União Europeia começa a abrir
brechas. O resultado do referendo na Grã-Bretanha e uma sondagem recente, na
República Checa, a revelar uma fraca adesão da população à permanência na UE, assim
o demonstra.
“Na
República Checa, segundo uma sondagem de abril, a satisfação com a adesão à
União Europeia, que aconteceu em 2004, diminuiu para 25%, abaixo dos 32%
registados no ano passado”, assinalava o jornal Diário de Notícias, o que levou o Presidente Milos Zeman a pedir um
referendo.
Passada
a euforia dos primeiros tempos, cheia das promessas dos "amanhãs que
cantam", começa a instalar-se um sentimento de descrença e de pessimismo,
plenamente justificado, perante a incapacidade dos dirigentes políticos
europeus de encontrar soluções eficazes e duradouras para resolver as crises,
que, e ao contrário do que dizem os europeístas fanáticos, já são estruturais e
não conjunturais.
O
presidente checo, ao defender um referendo sobre a continuação da permanência
do seu país na UE, e para o qual não tem poderes para o convocar, está a apontar
o caminho certo que todos os países membros deveriam começar a percorrer:
referendar a Europa. E valido esta ideia, embora esteja consciente dos perigos
e de alguns aspectos negativos das pulsões referendárias. Para esta questão
fundamental, este será o único processo (o outro será o processo
revolucionário) de quebrar o cerco armadilhado das eleições para os parlamentos
nacionais, em que o sistema tem dois grandes partidos - federados, financiados
e harmonizados doutrinariamente, a nível europeu, pelas suas respectivas internacionais – e que se apresentam ao
eleitorado como sendo partidos antagónicos, mas que, na realidade, são idênticos
no essencial. É nesta condição de cumplicidades ocultas que ambos cumprem o ritual da alternância do poder,
servindo um para governar e o outro para captar o descontentamento popular,
limitando assim o espaço de manobra dos verdadeiros partidos de esquerda.
Num
referendo sobre uma grande questão política fracturante, e tal como aconteceu
na Grã-Bretanha, o eleitorado tem tendência em segmentar-se transversalmente em
dois blocos, minando e limitando assim a acção dos partidos do sistema da
alternância, que têm mais dificuldade em controlar os seus tradicionais espaços
eleitorais.
Na
Grã-Bretanha, no referendo sobre a UE, esta transversalidade referida até
atingiu em cheio os deputados do parlamento, em que cada partido, o conservador
e o trabalhista, se fragmentou, nas duas opções que estavam a ser escrutinadas.
Pode dizer-se que os directórios partidários, por manifesta incapacidade ou por
uma premeditada inércia, não seguraram os seus eleitorados tradicionais.
Pretender
teimosamente construir um grande edifício, como é o da União Europeia e o do
seu subgrupo dos países do euro, sobre um terreno movediço, que está a perder
consistência e solidez, conduzirá à sua fatal derrocada, com terríveis
consequências económicas e sociais.
Querer
unir e federar a Europa é uma utopia. Nem pelas armas, Carlos Magno, Napoleão ou
Hitler a conseguiram unir. Por profundas razões históricas e pelas diversidades
linguísticas, a Europa é um mosaico de nações, com as quais os respectivos
povos se identificam. Só assim se compreende que o continente mais pequeno do
mundo, em área, seja aquele que mais países soberanos possui.
Na
Europa, o sentimento mais identitário é o sentimento nacional e não o
continental.
AC
2016 JUL 02
4 comentários:
Referendar a Europa? Ou referendar a União Europeia?
Claro que se trata de referendar a União Europeia. A palavra Europa aparece aqui como referência facilitadora do discurso, ao mesmo tempo que exprime também o facto de todos os países do continente já pertencerem à UE. Ao nível do discurso também se ganha a expressividade do lado figurativo da palavra.
Abraço.
Eu acredito
que é possível
uma Europa dos trabalhadores e dos povos
mudar o Mundo não custa muito
leva é tempo
Eu também acredito, Rogério. Mas temos de aproveitar todas as oportunidade e saber explorar s fraquezas dos adversários. O seu nervosismo actual é evidente, sinal que percebem que a casa poderá começar a arder. Até o "irrevogável" veio dizer que o Brexit era "o princípio do princípio do fim". E talvez seja.
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