A História
daquela Sexta-feira negra, a que os cristãos chamam Santa
Há
pouco, vi um pequeno filme que parodiava a Última Ceia, um filme de uma
comicidade modesta e, até, de duvidoso gosto. Tomei o seguinte apontamento, que
me veio à cabeça, naquele momento: "Afinal, aquilo foi tudo
combinado". E comecei a imaginar que a história poderia ter sido outra,
mais a meu gosto.
Não
eram doze, mas treze, o número de pessoas que se reuniram com Jesus, num
cenáculo de Jerusalém, para aquela famosa patuscada. Aos doze discípulos,
juntou-se Maria Madalena, que teve de esconder-se debaixo da mesa, para não
ficar na fotografia oficial, uma vez que as mulheres estavam excluídas destas
reuniões, destinadas apenas a homens de barbas. Em jeito de compensação, no dia
seguinte, e antes de ter sido preso, Jesus foi com Maria Madalena fazer um
piquenique, num pequeno bosque, nos arredores da cidade, onde ainda tiveram
tempo de cheirar as flores campestres, que já estavam a desabrochar, naquela Primavera,
que, naquele ano, chegou muito quente. E foi num pequeno lago, que havia ali,
que Maria Madalena deu o Último Banho" a Jesus, facto que foi ocultado
pelos apóstolos, quando escreveram os Evangelhos, e isto porque lhes convinha
apresentar Jesus aos crentes, como um ser totalmente assexuado. Como Maria
Madalena estava muito fragilizada, porque, devido ao calor, teve três desmaios,
Jesus foi a uma aldeia próxima e alugou, numa loja, uma bicicleta, a um
fariseu, aluguer esse que nunca chegou a ser pago, e que, por iniciativa
dos respectivos e sucessivos herdeiros, ainda hoje anda em disputa nos
tribunais eclesiásticos. E foi de bicicleta que ambos regressaram a Jerusalém,
ele a pedalar e ela sentada no assento sobre a roda traseira. Foi já perto do
Templo que uma patrulha de soldados romanos os mandou parar, tendo Jesus sido
preso, por não ter licença de condução, passada pela autoridade administrativa
romana. Os sacerdotes, que da escadaria do Templo presenciaram o incidente, e
como não perdoavam a Jesus o facto de Ele se considerar o Messias, enviado por
Jeová, souberam aproveitar a oportuna ocasião para o tramar, sublevando os
judeus mais radicais e acusando o “impostor” de promiscuidade. E é com esta
acusação que Jesus é levado à presença do cônsul Pilatos, que lavou as mãos e
assobiou para o lado, sendo, então, a populaça enfurecida a condená-lo à
crucificação.
Durante
aquele tormentoso percurso até a gólgota, Jesus, carregando o pesado madeiro,
sucumbiu três vezes, e, numa dessas quedas, foi Maria Madalena que lhe limpou a
cara, suja de sangue e de terra, com um pano de linho, onde ficaram marcadas,
como se fosse um negativo de uma fotografia a preto e branco, as linhas do
rosto, onde sobressaiam os olhos a evidenciar grande sofrimento, e a coroa de
espinhos, que a populaça, divertida, lhe enfiou na cabeça, como se, naqueles
conturbados tempos, já existisse Carnaval.
Morreu
trespassado por uma lança de um soldado romano, e nunca se chegou a saber se
aquilo foi um gesto de misericórdia, para abreviar o sofrimento do condenado,
ou se foi a manifestação de um automatismo, adquirido na guerra, em que, depois
da batalha vencida, se assassinavam os feridos graves, a sangue frio.
Maria
Madalena é que nunca mais retirou os olhos daquele rosto, um rosto que, ainda
naquela manhã, ela vira iluminado por um clarão, que só a alegria do prazer dá,
quando ambos cheiravam as flores campestres, no bosque. E ali ficou, sozinha,
depois de os familiares e os seguidores de Jesus terem debandado, quando
começou a anoitecer.
Julga-se
que foi ela que retirou o corpo de Jesus da cruz, não se sabendo onde o
sepultou. Também ninguém mais a viu. Ainda hoje, nas noites de lua cheia, se
ouvem os seus gritos, a fazerem eco na cerca de muralhas da cidade. Mas ninguém
quer ouvir estes gritos, porque Maria Madalena tornou-se incómoda para a
História Universal das Verdades Eternas e Indiscutíveis, livro que se
transformou no documento fundador do Internacionalismo Cristão, instituído por
Paulo de Tarso, na sequência daquele clarão deslumbrante, que rasgou o Céu e
iluminou a Terra, na Estrada de Damasco.
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