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quinta-feira, 21 de novembro de 2019

E se eu vos disser...




E se eu vos disser...

E se eu vos disser que me lembro
de todas as rugas daquele tempo
cavadas no granito e nos rostos...
E se eu vos disser que me lembro
da geografia da fome
e de todos aqueles para quem
a sua miserável pobreza
era a sua maior riqueza...
E se eu vos disser que ainda ouço
a voz das pedras dos caminhos e dos casebres
e o crepitar do lume das lareiras, nos Invernos,
para aquecer o frio e fazer crescer os sonhos...
E se eu vos disser que aquele tempo 
era um tempo sem tempo,
que apenas sevia para esperar a morte...
E se eu vos disser que o mundo
nascia e morria ali,
porque não havia mais mundos
para além das serranias e dos baldios...
E se eu vos disser que tudo isto
é memória dorida, 
ferida a sangrar em carne viva
que o tempo não alivia...
Este era o meu povo,
o povo ignorado que não esqueço
e que ainda trago na lembrança…

Alexandre de Castro

Lisboa, Outubro de 2014

terça-feira, 21 de maio de 2019

Dissertação sobre o Big Bang…





Dissertação sobre o Big Bang…


E naquele momento zero em que tudo começou,
no primeiro segundo cósmico,
surgido a partir do Nada
a energia, concentrada e tensa, explodiu
fazendo saltar matéria incandescente a alta velocidade
para formar estrelas, cometas, planetas e galáxias
a ensaiar uma louca dança orbital
e a obedecer com precisão infinita
à lei da gravitação universal.
Newton ainda estava a muitos anos-luz de distância
na escala temporal, até uma maçã o despertar.
Galileu leu todos os sinais dos céus,
observou, fez experiências, analisou e calculou
e tudo ficou mais claro e transparente
para um cabal e definitivo entendimento.
Nem o Papa, que o mandou calar,
nem a sentença da Sagrada Inquisição
estancou aquele pensamento perverso
de ser a Terra continuamente a rodar
e de nunca ter sido o centro do Universo
desmentindo assim as verdades divinas
vertidas pela Fé nas Escrituras
e o Mundo continuou a girar, a girar,
rasgando segredos e descobrindo infinitos
com estrelas ainda a nascer
e outras a desaparecer, em lenta agonia cósmica
até um buraco negro as devorar
como se tudo se reduzisse a uma liminar equação
entre energia e matéria, na sua matemática relação
e que Einstein revolucionariamente resolveu.
Mas há ainda uma outra lei desconhecida,
a do ciclo e do contra-ciclo, marcada pelo tempo,
com o Universo a inverter-se e a matéria a contrair-se
quando  a energia se esgotar e o espaço terminar,
deixando de se dilatar
aparecendo, então, uma força descomunal
a esmagar galáxias, estrelas, cometas e planetas
(fulminando a Humanidade, se ela ainda existir)
até a matéria se dissolver
e a energia regressar ao ponto inicial
para um outro Big Bang começar…

Alexandre de Castro

Lisboa, Dezembro de 2008

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Dissertação sobre a ode à liberdade…




Dissertação sobre a ode à liberdade…


A todos os tarrafalistas
e aos que tombaram pela liberdade


Já só tenho muros à minha volta
grades nas janelas sem vidraças
para que as palavras arrefeçam lentamente
escrevo nas paredes
os nomes e os símbolos
daquilo em que acredito
e já não tenho medo do carcereiro
nem do degredo
levo as mãos para as algemas
e olhos e alma para chorar
mas serei amanhã um homem livre…

Alexandre de Castro

Lisboa, Novembro de 2007

sábado, 6 de abril de 2019

Brenda Fassie, a "Madona dos municípios"




Brenda Fassie, a "Madona dos municípios"


A "poeta" Maria Gomes homenageou, no Google+, Brenda Fassie, a cantora negra sul-africana, a quem a revista Time chamou a "Madona dos municípios", e que morreu precocemente em Maio de 2004. Era a voz dos marginalizados, escreve a "poeta", no seu texto. Era a voz da negritude, acrescentarei eu, num país que viveu a humilhação e o horror do apartheid.
Deixo aqui, a acompanhar o vídeo da malograda cantora, na sua interpretação de "Meneza", o texto e o belíssimo poema, que a "poeta" Maria Gomes lhe dedicou.
Alexandre de Castro

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"A Madonna dos municípios" foi Brenda Fassie, cantora pop sul-africana. A sua voz foi a voz dos marginalizados do apartheid.
A sua voz leva-me aos difíceis anos 90, anos de guerra. Ressoava noite adentro, vindo algures das redondezas da minha casa... e eu ficava, muito quieta, entregue àqueles acordes e à noite, sentindo um
renascer da esperança. Brenda foi, também para mim, a luz da noite escura. 

Ainda é.
"A Madonna dos municípios" morreu aos 39 anos em Joanesburgo, a 9 de Maio de 2004, com uma overdose de cocaína. Seu colapso e consequente internamento no hospital Sunninghill foi notícia de primeira página na imprensa sul-africana. Nelson Mandela e Thabo Mbeki visitaram-na no hospital.

Poema

Imorredoura voz, mãe da serenidade aflorando
do abraço infinito em que regresso,
haverá um país talhado na cartografia do amor?
Ó fogo que arde, ó flor do tumulto,
dai-me uma ave imaginária, uma paisagem real,
para que eu viva um caudal de enlevo
e erga as cinzas do poema na obstinação e na candura.

__________mariagomes

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2019 04 06

domingo, 24 de março de 2019

A "decapitação" de Theresa May




A "decapitação" de Theresa May

Se Theresa May - uma política que me convenceu, embora eu me encontre nos antípodas da sua linha ideológica - for "decapitada" pelos deputados do seu próprio partido, o Reino Unido, com o tempo, passará a ser uma colónia da Alemanha, como já o são Portugal e a Grécia. Não colónias do tipo clássico, como o foram as colónias africanas do passado, mas colónias em que a dominação é ocultada pela acção política e financeira da UE, e que o cidadão comum não percebe. Deste modo, com a UE e também com a instituição do Euro (à qual o Reino Unido ainda não aderiu), a Alemanha, paulatinamente, está a marcar pontos, para obter o ambicionado estatuto de grande potência mundial. Está a conseguir aquilo que não conseguiu com as duas guerras mundiais, que desencadeou no século XX, e que, como consequência, ditaram o declínio da Europa.

Theresa May, apesar de não ser favorável ao Brexit, assumiu, como ponto de honra, obedecer ao resultado do referendo, que lhe foi adverso, e tudo fez para que o Reino Unido saísse do campo armadilhado da UE. Esta coerência e esta honestidade, que é rara no mundo da política, têm de lhe ser reconhecidas.

Alexandre de Castro
2019 03 24

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

Poema onde cabe o silêncio...


Poema onde cabe o silêncio…

Falas-me todos os dias
naqueles teus silêncios mudos
em que és a excelsa  esfinge
e a inefável  musa…
Falas-me com os teus olhos líquidos
pousados na minha sombra
para eu ouvir o eco do teu corpo
e eu sinto o aperto do teu abraço
a envolver o mundo,
e mergulho no teu sono
onde estão guardadas todas as tuas jóias…
Caminho pelos trilhos da escuridão
entre mundos que se repetem e se consomem
na voracidade do tempo…

Jamais me encontrarei comigo próprio…
Sou a raiz viva de uma árvore morta…

Alexandre de Castro

Lisboa, Junho de 2016

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Um país que envelhece é um país que empobrece


Um país que envelhece é um país que empobrece

As perspectivas demográficas, para Portugal, não são animadoras. Até 2080, Portugal perderá 2,6 milhões de habitantes e o número de jovens diminuirá de 1,4 milhões para 900.000, revelou o INE, em Junho passado, ao mesmo tempo que informou que o número de idosos deverá aumentar de 2,2 milhões para 2,8 milhões. “No futuro, mantém-se o declínio populacional e o agravamento do envelhecimento demográfico”, antevê o INE.
Perante estas projecções, no final do século, Portugal será um país de velhos. E um país que envelhece é um país que empobrece. E eu não vejo os nossos políticos, os dos partidos do arco do poder (PS, PSD e CDS), a encararem de frente este grave problema, preocupados que estão, a fim de politicamente sobreviverem, em aplicar apenas políticas de curto e médio prazo, muitas delas viciadas com o traiçoeiro e enganador eleitoralismo.
Em vez de construir, estamos, por antecipação e por inércia, a destruir o Portugal do futuro, assumindo por inteiro aquele adágio “quem cá fica que se amanhe”.

Alexandre de Castro
2019 02 20

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Último Testemunho de Unamuno...



Último Testemunho de Unamuno...

Tal como Pablo Neruda morreu dias depois do golpe de Pinochet, também Miguel Unamuno não sobreviveu por muito tempo ao golpe de Franco.

Morreu amargurado ao ver a sua Espanha dominada pela barbárie fascista e suportou desassombradamente todos os enxovalhos e insultos a que o submeteram as autoridades franquistas, logo no início da Guerra Civil, destacando-se o célebre episódio ocorrido na sessão solene da abertura do ano académico da Universidade de Salamanca, de que era reitor, onde o grosseiro general franquista Millán Astray, que presidia, lançou o animalesco grito "Muera la inteligência".

E foi com este mesmo bárbaro grito que os assassinos de Garcia Lorca comemoraram com uma bebida, num bar de Granada, a perpetração do seu hediondo crime.

Unamuno foi um dos mais brilhantes escritores da sua geração. Pertenceu ao movimento literário, denominado "Geração de 98", onde também pontificavam Ortega y Gasset e Perez de Ayala. É considerado um Príncipe das Letras Espanholas, juntando o seu nome à Galeria de Honra formada por Cervantes e Quevedo.

Visitou várias vezes Portugal, onde tinha alguns amigos, tendo enaltecido o facto das letras portuguesas, com a geração do Orpheu, terem aderido rapidamente ao movimento modernista, nascido em Itália em 1910.

Alexandre de Castro
04 de Janeiro de 2009

quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

A realidade na Venezuela é esta: garantir, por parte dos EUA - e tal como aconteceu no Iraque e na Líbia - o controlo das maiores reserva de petróleo do mundo



Para se perceberem melhor as hipócritas intenções dos EUA e dos países ocidentais, seus fiéis aliados, é necessário rever o que se passou no Iraque e na Líbia, em que as respectivas invasões militares, que destruíram aqueles dois países, foram justificadas pela cruzada da democracia, e precedida pela diabolização de Saddam Hussein e de Kadafi, que foram barbaramente assassinados, por mercenários dos países invasores. E o denominador comum entre aqueles dois martirizados países e a Venezuela, é que todos eles têm petróleo, no seu subsolo. Se a Venezuela de Maduro sucumbir aos lacaios treinados pela CIA, os EUA ficam a dominar as principais reservas de petróleo do mundo, o que constituirá uma enorme vantagem estratégica em relação à Rússia e à China.  E andam por aí uns tolos a reduzirem tudo isto à democracia, aos Direitos Humanos e à Liberdade, quando tudo não passa de uma grosseira cabala para justificar o saque.

Alexandre de Castro
2019 01 30

sábado, 26 de janeiro de 2019

O Mundo emocionou-se com o drama do pequeno Julen


O Mundo emocionou-se com o drama do pequeno Julen

Chegou ao fim o drama do pequeno Julen, que teve um fim decepcionante, embora esperado. Um drama que emocionou o mundo, numa grande e silenciosa manifestação solidária global, como já não se via há muito tempo. Resta registar e louvar o esforço e a abnegação de toda a equipa de salvamento, que, em condições muito adversas, foi rápida e eficiente na sua actuação. Julgo que todos os seus elementos teriam chorado, perante o facto de não terem encontrado o Julen com vida. Ficou, contudo, a consolação de resgatarem o seu corpo morto, para que os seus pais o possam enterrar com toda a dignidade, que a morte de um ente querido reclama.

Alexandre de Castro
2019 01 26
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sábado, 19 de janeiro de 2019

A Revolta da Marinha Grande em 1934


A 18 de Janeiro de 1934, a Marinha Grande acordou com um levantamento operário vidreiro contra a fascização dos sindicatos enquadrada pelo Estatuto Nacional do Trabalho. Os revoltosos conseguiram tomar o poder por algumas horas, mas a repressão de Salazar acabaria por esmagar a revolta e enclausurar os revoltosos nos cárceres do fascismo, onde alguns jaziram. Em 29 de Outubro desse ano, 57 marinhenses que participaram no 18 de Janeiro inauguraram o Campo do Tarrafal, na ilha de Santiago, em Cabo Verde
Jornal AbrilAbril 

***«»***
Estes homens foram os “Heróis” de um tempo em que a fome não era uma metáfora.
Alexandre de Castro
2019 01 19

segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

MASSACRE INDÍGENA, MATO GROSSO DO SUL



AMAZÓNIA:
O massacre das populações indígenas e a desmatação da Amazónia

Este apelo desesperado de uma indígena Guaanys Kaiowà é de 2016. Em lágrimas, ela denunciava o massacre que estava a ser perpetrado sobre o seu povo.
O mundo ficou calado e mudo!... Os governos ocidentais, tão diligentes em condenar os países considerados inimigos de estimação, por estes, supostamente, não respeitaram os direitos humanos, também ficaram calados, tentando, assim, esconder a sua cumplicidade. O mesmo se pode dizer da comunicação social, toda ela nas mãos das classes possidentes, que à distância comandam o poder político.
E, com a eleição do fascista Bolsonaro, as comunidades índias correm o risco de ser dizimadas, para abrir caminho ao sector do agro-negócio, que pretende instalar-se na Amazónia, desmatando-a e destruindo-a progressivamente, acções estas, que irão contribuir para o agravamento das alterações climáticas.
Estamos na presença de crimes contra a Humanidade, que é necessário denunciar em todas as instâncias. E a divulgação, através das redes sociais, deste vídeo e deste texto, poderá ser o início de um longo caminho, se todos colaborarem.
Alexandre de Castro