Páginas

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Presunção e água benta, cada um toma a que quer…



Presunção e água benta, cada um toma a que quer…

“Ainda não aprenderam a ler-me: tentam abrir a porta com a chave que trazem no bolso, pequenina, estreita. E surpreende-me que não vejam que basta empurrar a maçaneta com um dedo”.
António Lobo Antunes

In Revista Visão - O vivo e puro amor de que sou feito.
[Citado por Marina Costa]
***«»***

Fora dos holofotes da fama, que granjeou como grande romancista, António Lobo Antunes não é assim tão magnânimo como pretende fazer crer, com a belíssima metáfora da chave, da maçaneta e da porta. Diz, quem o conhece pessoalmente, que é um homem azedo e pedante e que gosta de ver o mundo a seus pés.

No entanto, esta afirmação não ofusca nem obnubila o seu génio, como escritor, bem evidente, principalmente, nos seus primeiros romances.

Ele nunca perdoou o facto de ter sido preterido na atribuição do Prémio Nobel da Literatura, em relação a Saramago, e não compreendeu que o Memorial do Convento é uma obra de dimensão universal, que se impôs pela sua densa textura e pela sua grandiosa temática. Nesta obra, Saramago falou com as centenárias pedras do convento de Mafra e com as suas sombras, reconstruindo a história desse tempo opaco, de uma religiosidade fanática e cruel, que não salvava as almas, antes as queimava no patíbulo, onde ardia o fogo purificador da fogueira inquisitorial.
Alexandre de Castro
2018 08 30