Ou a Europa arrepia caminho em relação à
austeridade ou o resultado da receita será apenas mais pobreza. Esta é a
principal conclusão do último relatório da organização não governamental (ONG)
Oxfam, que destaca Portugal como um dos casos onde as políticas seguidas estão
a beneficiar apenas os mais ricos e a colocar o país em risco de se tornar num
dos mais desiguais do mundo.
De acordo com o relatório da Oxfam, se nada for
feito e as medidas de austeridade actualmente em vigor continuarem a ser
implementas, em 2025 vão estar em risco de pobreza cerca de 25 milhões de
europeus. “Apelamos aos Governos europeus que liderem um novo modelo social e
económico que invista nas pessoas, reforce a democracia e procure um sistema
fiscal justo”, afirma Natalia Alonso, responsável pela Oxfam na União Europeia.
Outro problema é que a organização, que foi
formada em 1995 por 17 ONG internacionais espalhadas por 90 países, estima que
possam ser necessários 25 anos para que se recupere o nível de vida que se
tinha antes da crise económica e financeira – um caminho que só poderá ser
invertido com medidas muito bem estruturadas de combate à pobreza.
Mais endividamento, menos crescimento
O relatório intitulado A
Cautionary Tale: The true cost of austerity and inequality in Europe surge
nas vésperas do encontro dos ministros europeus da Economia e pretende alertar
os responsáveis políticos para que os resgates financeiros que têm vindo a ser
feitos apenas estão a causar níveis de pobreza e de desigualdade que podem
perdurar décadas. “Pelo contrário, as medidas de austeridade não estão a
conseguir reduzir o nível de endividamento tal como se supunha que fariam, nem
a impulsionar um crescimento económico inclusivo”, diz a Oxfam.
Ainda em relação a Portugal, a ONG salienta que
a crise está a afectar muitos jovens, mas também a dificultar a vida a
populações que são sempre mais vulneráveis nestas alturas, como as mulheres.
Além disso, mesmo quando se mantêm os apoios sociais “adoptam-se diversas
medidas que aumentam os requisitos que devem cumprir os desempregados” para
poderem aceder às ajudas.
Desigualdade nos rendimentos
O relatório salienta também a pressão internacional para Portugal privatizar serviços como a energia, água e transportes, assim como alguns serviços de saúde, ao mesmo tempo que deveria liberalizar o mercado laboral. Só que aponta que tudo isto foi feito sem a garantia das devidas protecções ao emprego e sem uma vigilância apertada.
O relatório salienta também a pressão internacional para Portugal privatizar serviços como a energia, água e transportes, assim como alguns serviços de saúde, ao mesmo tempo que deveria liberalizar o mercado laboral. Só que aponta que tudo isto foi feito sem a garantia das devidas protecções ao emprego e sem uma vigilância apertada.
“Grécia, Portugal e Espanha aplicaram políticas
dirigidas a desmantelar os sistemas de negociação colectiva, o que
provavelmente se traduzirá no aumento da desigualdade e na queda contínua do
valor real dos salários”, lê-se no documento – que refere ainda o aumento o IVA
como mais um factor que dificultou o poder de compra no país.
Sobre Portugal é ainda dito que entre 2010 e
2011 a desigualdade nos rendimentos tem beneficiado as “elites económicas”,
dando-se como exemplo o crescimento do mercado de bens de luxo, e é dito que
após as crises financeiras em geral os mais ricos vêem os seus rendimentos
crescer 10% enquanto os mais pobres os perdem na mesma proporção.
Lições da América Latina, Sudeste Asiático e
África
Para esta organização a União Europeia deve
tirar lições de outros períodos de austeridade que foram, por exemplo, vividos
em países da América Latina, do Sudeste Asiático ou de África durante as
décadas de 1980 e 1990, para evitar cair nos mesmos erros.
“A gestão europeia da crise económica ameaça
reverter décadas de progresso em matéria de direitos sociais. Os agressivos
cortes na segurança social, na saúde e na educação, as reduções nos direitos
dos trabalhadores e um sistema fiscal injusto estão a envolver milhões de
cidadãos europeus num ciclo vicioso de pobreza que pode perdurar durante
gerações. Não faz nenhum sentido nem do ponto de vista moral nem económico”,
reforça Natalia Alonso. A responsável insiste que as medidas tomadas apenas
beneficiam os 10% da população mais rica.
No relatório são citados exemplos concretos de
países, além de Portugal, como Espanha, Grécia, Irlanda e Reino Unido, onde a
austeridade está a ser aplicada de forma mais rigorosa, defendendo-se que
“rapidamente estarão entre os países com maior desigualdade do mundo se os seus
líderes não mudarem de rumo”.
Aliás, o documento lembra que as próprias
instâncias internacionais, como o Fundo Monetário Internacional, três anos após
os memorandos de entendimento com alguns países “estão a reconhecer que as suas
medidas não só não conseguiram reduzir o endividamento público e os défices
orçamentais, como pelo contrário aumentaram a desigualdade e travaram o
crescimento económico”.
O próprio prefácio deste relatório é feito pelo
Nobel da Economia Joseph Stiglitz que escreve que “a onda de austeridade
económica que varreu a Europa corre o risco de provocar danos sérios e
permanentes ao modelo social”, insistindo que “está a contribuir para a
desigualdade que vai tornar as fraquezas económicas mais duradouras”.
Mais pobres que os pais
Para a Oxfam os recordes atingidos no desemprego
são o maior exemplo disso, sobretudo entre os mais jovens, assim como a redução
de salário. “Pelo menos um em cada dez famílias europeias com trabalho vive na
pobreza e esta estatística pode piorar gravemente”, alerta o relatório, que diz
que mesmo as pessoas com trabalho serão muito mais pobres que os seus pais.
A Oxfam insiste que a história se está a repetir
e que “os nossos líderes estão a ignorar as consequências das medidas de
austeridade”, voltando a citar casos em que houve cortes ou privatizações na
saúde e na educação e em que a consequência foi “um fosso entre pobres e
ricos”. “A Indonésia demorou dez anos a voltar aos níveis de pobreza de 1997
enquanto alguns países latino-americanos demoraram 25 anos a voltar ao que
tinham antes de 1981”, defende Natalia Alonso.
***«»***
Um relatório arrasador e demolidor que projeta
para o futuro um cenário dantesco e aterrador.
Com a insistência obsessiva de aplicar duras
políticas de austeridade, invocando o álibi da correção de défices públicos
excessivos e também a solvência das enormes dívidas externas, que o próprio
sistema bancário internacional provocou, para delas obter elevados juros,
muitos deles já cobrados, o imperialismo financeiro ocidental procura agora a
desvalorização salarial, principalmente a dos salários mais baixos (mantendo
intocáveis os rendimentos do capital), para poder ganhar competitividade, a
nível económico, em relação aos países emergentes, principalmente os do leste
da Ásia, que, com salários mais baixos e com o acesso já garantido às
tecnologias de ponta e a todas as áreas do conhecimento, ameaçam a economia da
Europa e a dos Estados Unidos. O que está a ser feito com a austeridade é
provocar o nivelamento por baixo, reduzindo salários e pensões de reformas e
libertando as correspondentes disponibilidades financeiras dos estados, através
da destruição do Estado Social, para disponibilizar para os bancos e para os
projetos dos grupos económicos. Em Portugal, já se percebeu que o governo vai
destruir parte do Serviço Nacional de Saúde (a parte mas rentável), e a escola
pública para outorgar ao setor privado a respetiva gestão e exploração. O mesmo se
irá passar com a Segurança Social, com as seguradoras a abocanharem a parte de
leão. Tudo isto em prejuízo da classe média e das camadas populacionais mais frágeis.
Prossegue, pois, por parte do imperialismo financeiro
ocidental, a tentativa de promover a transferência da riqueza dos países pobres para os
países mais ricos, e, dentro de cada país, transferir os rendimentos do
trabalho para os rendimentos do capital.
É este o grande plano do capitalismo, que, para
melhor atingir os seus objetivos, se serve da cumplicidade de governos liberais,
socialistas e sociais democratas, engajados ao sistema, e da complexa rede
de off shores, que, na década de setenta
do século passado, criou e espalhou pelo mundo, para resguardar os capitais da
cobrança de impostos, nos seus respetivos países de origem, como a ONG Oxfam
denunciou em Maio último (ver aqui).
AC
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