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sexta-feira, 28 de julho de 2017

Manifesto: Pela nossa saúde, pelo SNS


Manifesto: Pela nossa saúde, pelo SNS

Porque é um assunto que a todos nos diz respeito, tomo a liberdade de vos contactar para vos convidar a subscrever este Manifesto, que visa influenciar o governo a ter uma política de saúde que tenha também em conta a promoção da saúde e a prevenção da doença. De há muito que o SNS se tem centrado quase exclusivamente na prestação de cuidados na doença. Ora essa estratégia é socialmente insustentável e financeiramente incomportável. Contamos, por isso, com a vossa subscrição e com a divulgação do Manifesto pelos teus contactos. Para subscrever basta declarar que subscreve.

Manifesto
 
Pela nossa saúde, pelo SNS

 A razão de os signatários se dirigirem aos portugueses decorre da análise que fazem da actual situação no sector da saúde, a qual, quase a meio do mandato do governo, permanece sem sinais de mudança que alterem a natureza do modelo de política de saúde, promovendo a saúde dos portugueses, reabilitando e requalificando o Serviço Nacional de Saúde. O qual dificilmente se verificará sem a contribuição activa dos actores sociais e políticos das comunidades.

O sistema público de saúde carece do financiamento ajustado à sua missão: promover a saúde, prevenir e tratar a doença. Sem essa condição não só o SNS vai definhando, vendo reduzido um dos seus principais valores, a cobertura universal, como as respostas que vai dando são canalizadas quase exclusivamente, e já em condições precárias, para o tratamento da doença e para contribuir para o florescimento da prestação privada. Em seis anos (2009-2015) a despesa pública da saúde diminuiu 21%, tendo passado de 6,9% para 5,8% do PIB. Os signatários tomam, por isso, como referência a despesa verificada em 2009, que foi de 9,9% do PIB, um ponto percentual acima do verificado em 2015. Além disso, percentagem do financiamento público dos cuidados de saúde prestados à população é desde 2014 das mais baixas da Europa a 28 (66%).

O diagnóstico que melhor caracteriza a saúde da população é dado pelos seguintes indicadores-chave. (1)  com 70% de esperança de vida saudável (2015), os portugueses tinham o mais baixo valor dos países do sul da Europa – Espanha, França, Itália e Grécia; (2) com 32% de esperança de vida saudável aos 65 anos, os portugueses ficam bastante aquém dos valores daqueles países; (3) no grupo etário 16-64 anos só 58% da população considerava que a sua saúde era boa ou muito boa, quando na Grécia ou em Espanha é superior a 80% (2015); (4) no grupo com mais de 64 anos aquela percepção é de 12%, sendo em Espanha e França superior a 40%; (5) mais de 50% da população tem excesso de peso; (6) em 2016 verificou-se o maior excesso de mortalidade da década, correspondente a 4 632 óbitos.

Nos setenta e sete hospitais da rede pública, cerca de 800 000 utentes aguardam com excesso de espera uma primeira consulta hospitalar, correspondendo a 30% das primeiras consultas realizadas em 2016. Esse excesso varia entre 2 e  >800 dias. Mais de oitocentos mil portugueses não têm médico de família atribuído. Entre 2014 e 2016 verificou-se um aumento de 529 000 urgências.

Esta situação é já bastante preocupante. Continua a insistir-se num modelo de política de saúde exclusivamente orientado para o tratamento da doença e centrado nas tradicionais instituições de saúde. Quando a regra é ser-se saudável e a excepção é estar-se doente, a quase totalidade dos recursos são canalizados para a excepção, embora a promoção e a protecção da saúde sejam as intervenções que mais contribuem para melhorar o bem-estar das pessoas e das comunidades, e a estratégia que torna os sistemas de saúde sustentáveis. Do que se trata, por isso, não é de medidas avulsas que dificilmente se articulam entre si, mas de uma reforma que integre cuidados hospitalares, cuidados continuados, cuidados de saúde primários e intervenções em saúde pública, que inclua os actores formais e informais das comunidades locais e que incorpore o melhor conhecimento científico disponível.

Mas mesmo quando se trata da prestação de cuidados na doença, as limitações ao acesso mantém-se como o maior obstáculo aos serviços de saúde no momento em que são necessários, com as consequências negativas daí decorrentes para a condição dos doentes. Os tempos de espera inadmissíveis são disso a melhor evidência e o crescimento da afluência às urgências o pior sintoma da disfunção que reina no sector.

O excesso de mortalidade, verificado sobretudo entre a população idosa e durante o verão e o inverno, quando se verificam temperaturas mais extremas, exige que os cuidados domiciliários sejam mais frequentes e que tanto as autarquias como os serviços de segurança social façam um acompanhamento de maior proximidade respondendo às necessidades de cuidados de conforto que nestas alturas são particularmente sentidas.

No que se refere ao sector privado exige-se que a sua regulação se faça do lado do cumprimento de critérios de ordenamento das instituições de saúde, que a certificação inclua o preenchimento dos quadros de pessoal com a diferenciação ajustados à sua missão, às valências e ao volume de produção previsto, e que a demonstração dos resultados de gerência sejam obrigatórios e públicos.

As várias greves do pessoal da saúde – médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e outros trabalhadores -, em que se verificou tanto uma grande adesão desses profissionais como uma considerável compreensão por parte da população, representam sinais que devem ser entendidos e interpretados como manifestações críticas da situação que se está a viver no sector.

Os signatários deste Manifesto têm uma longa história de serviço público no Serviço Nacional de Saúde e de dedicação à causa da saúde. A maior parte deles contribuiu para que ele se implantasse nos primeiros anos da sua criação, foram seus profissionais empenhados desde então e bateram-se por diversas vezes contra os ataques que lhe foram movidos. Não estão, por isso, dispostos a assistir ao seu progressivo definhamento. Se, como é defendido, o SNS representa um dos mais relevantes serviços que a democracia tem prestado aos portugueses, então há que proceder à sua reabilitação e requalificação, alterando substancialmente o sentido da política de saúde. Passados 38 anos da sua criação, o SNS não pode ficar imóvel e alheio aos desafios que lhe são colocados. Nesta exigência estamos acompanhados pelos mais prestigiados peritos na matéria, como Ilona Kickbusch, David Gleicher e Hans Kluge da OMS, e Nigel Crisp, coordenador da Plataforma Gulbenkian Health in Portugal.

Por isso nos dirigimos também a todas as organizações partidárias que subscreveram os acordos de 10 de Novembro de 2015, na expectativa de que sejam sensíveis a esta necessidade inadiável e tomem as decisões que a situação descrita exige. Esta política de saúde já mostrou que não está a responder ao que é exigido de um governo que se afirma empenhado em dar uma orientação de esquerda às suas políticas sociais. Está, por isso, nas mãos da actual maioria parlamentar iniciarem o processo de mudança da política de saúde.

 Primeiros subscritores:
Aguinaldo Cabral, António Manuel Faria-Vaz, Armando Brito de Sá, Cipriano Justo, Deolinda Barata, Fernando Gomes, Guadalupe Simões, Jaime Correia de Sousa, Jaime Mendes, João Proença, Jorge Espírito Santo, José Aranda da Silva, José Carlos Martins, José Frade, José Manuel Boavida, Maria Augusta Sousa, Maria João Andrade, Maria Manuel Deveza, Mariana Neto, Mário Carreira, Mário Jorge Neves, Nídia Zózimo, Paulo Fidalgo, Sérgio Esperança, Sofia Crisóstomo, Teresa Gago.

***«»***

Como não possui o texto original deste Manifesto, o leitor, que pretenda subscrevê-lo, poderá proceder de duas maneiras:

1º - Através do blogue, a mais fácil e a mais directa: Isole esta publicação, clicando no título, e, através de copy, envie o respectivo link, por email, depois de escrever a palavra “Subscrevo”, para o seguinte endereço electrónico: Cipriano Justo justo.cipriano@gmail.com.
2º - O menos imediato: Envie uma mensagem para o endereço, anteriormente assinalado, e solicite o envio do texto do Manifesto, que reencaminhará para o remetente, depois de escrever “Subscrevo”.

Lembre-se que ao subscrever este Manifesto está a defender a sua Saúde. Todos nós, mais tarde ou mais cedo, vamos precisar de recorrer, sem preocupações financeiras e com a garantia de qualidade dos serviços prestados, a uma unidade do SNS, seja qualquer for a natureza e a gravidade da respectiva patologia.
Por outro lado, ao subscrever este manifesto, está a exercer o seu direito de cidadania, defendendo a existência de um SNS, universal e tendencialmente gratuito, e que se revelou, juntamente com a Liberdade e a Democracia, a maior conquista do 25 de Abril.
Não seja “trouxa”, e adira já à subscrição deste Manifesto. Antes que seja tarde.
Informo-o também que todos os primeiros subscritores deste Manifesto são médicos que rejeitam a perversa ideia de que a Saúde tem de ser um negócio.
Alexandre de Castro  

Ver também aqui.
2017 07 28

sábado, 22 de julho de 2017

A Origem das Religiões (*)


A Origem das Religiões (*)

Estamos na presença de um texto rigoroso, que procura tentar compreender a complexa relação entre o Homem e a Religião. E o autor define, logo no início, o campo da sua visão, com o qual concordo, quando diz que "a religiosidade, como geralmente a entendemos, vivida por espíritos conservadores, é uma limitadora das possibilidades humanas". Mas, além das vivências actuais, baseadas nas Religiões do Livro, que, no Ocidente, aprofundaram, desde a sua origem, essa capacidade limitadora da mente dos crentes, o que possibilitou a sua avançada forma de institucionalização, temos de encontrar, através da Antropologia, a razão primeira dessa enraizada pré-disposição do Homem para se sujeitar acriticamente a uma tal situação de subjugação.
Dou como garantido que a crença numa entidade superior começou com os primeiros grunhidos da Humanidade. Ou seja, associou-se naturalmente ao desenvolvimento dos mais primitivos pensamentos dos Homo sapiens, pensamentos ainda lineares e esquemáticos, e das primeiras tentativas de articular sons guturais, com os quais pretendiam comunicar. E nesses primeiros pensamentos,  embora muito concentrados à volta das questões da sua subsistência, surgiu naturalmente a primeira pergunta sobre a sua própria identidade e a identidade de quem construíra o mundo visível a seus olhos, processo esse que durou milhares de anos, o tempo suficiente para projectarem a mente para o Além, para uma entidade invisível superior. Nascera a crença... Mais uns milhares de anos, mais à frente, quando a organização social evoluiu para as formas superiores da sua hierarquização, aceitando um líder que se impunha pelo seu poder, é que se inicia o processo da institucionalização da crença. O próprio poder político necessitava, para se legitimar, do novo poder que surgia, o poder religioso, normalmente concentrado no líder, que rapidamente sentiu a necessidade de ser acolitado por clérigos obedientes.
E assim chegamos ao Judaísmo, ao Cristianismo e ao Islamismo, a marcarem o tempo da História, e constituindo-se em objecto e pretexto de muitas guerras.
Alexandre de Castro

terça-feira, 4 de julho de 2017

De Pedrógão Grande à Feira de Carcavelos. As televisões vendem tudo e tudo é contrafeito. _ Carlos Matos Gomes

Vómito televisivo


De Pedrógão Grande à Feira de Carcavelos. As televisões vendem tudo e tudo é contrafeito.

Carlos Matos Gomes

Conclusões do que aconteceu em Pedrógão: Depois das reportagens de Fátima, das reportagens da celebração do campeonato de futebol, as televisões comprovaram que o populismo existe e está tão encarniçado como as labaredas do grande fogo que mataram e devastaram. O populismo é o apelo à excitação e à irracionalidade. Depois do que as televisões, principalmente as televisões que são o grande meio de manipulação de massas, fizeram a propósito de um fenómeno religioso, da excitação de um fenómeno desportivo, as televisões exibiram as suas melhores figuras, desorbitadas, de pregadores das igrejas dos últimos dias no aproveitamento de uma tragédia. As televisões provaram que não faltam atiçadores de populaça para qualquer campanha. As labaredas de Pedrógão mataram pessoas e destruíram bens materiais, mas mataram queimaram a ideia de uma televisão como meio credível de informação e esclarecimento. A televisão, enquanto meio de comunicação, sai queimada de Pedrógão. A televisão portuguesa despiu-se de pruridos e apresentou-se como é: Um Big Brother, uma Casa de Segredos. As vedetas das televisões são clones da Teresa Guilherme.

O populismo é uma evidência quando o mais poderoso meio de manipulação do comportamento de massas utiliza as suas figuras mais conhecidas para fazerem apelo aos sentimentos mais primários e irracionais e estas o assumem com a convicção de pastores da igreja dos santos do últimos dias, da Maná, das testemunha de Jeová.

Os acontecimentos de Pedrógão provaram que o melhor das televisões, principalmente das televisões, são Teresas Guilherme pregando sobre as labaredas de Pedrógão como se fossem as do inferno, despejando discursos sem pudor, ora excitados ora choramingas, sempre vazios. Gente capaz de tudo. Todos os acontecimentos são um espectáculo, de um cadáver ao desespero de alguém que perdeu tudo. O grito dos populistas é sempre: queremos carne, queremos sangue. Em Roma gritariam por um cristão para atirar aos leões, em Lisboa ou em Madrid pediriam judeus para queimar nas fogueiras da inquisição. Em Pedrógão queriam um ministro, um secretário de Estado, um GNR que tenha dado uma indicação errada, um avião que não caiiu! Nos intervalos puxam à lágrima fácil.

Um populista com um microfone e uma câmara perora diante de homens e viaturas que se movimentam e correm, anuncia: há uma completa descoordenação no combate ao fogo. Há duzentos anos, numa obra clássica, «A Guerra», o autor, Clausewitz, escrevia sobre a natureza da batalha: “a reunião perfeita de todas as forças num mesmo momento é contrária à natureza da guerra.” A batalha, o combate, seja contra outros homens, seja contra um fogo,não é um bailado, nem uma tabuleiro onde se movimentam soldadinhos de chumbo em movimentos geométricos. O campo de batalha é caótico, mas ninguém conseguirá que um populista de câmara e microfone entenda isto. Eles estão diante das câmaras para acusar os homens e a natureza. Querem vender mortos e pendurar vivos no pelourinho. Querem demissão de ministros, querem apanhar a contradição entre um secretário e um sub-secretário.

Mas o chocante, é que são estes pastores populistas — e não houve vedeta da televisão que não quisesse aparecer em Pedrógão (faltou o Rodrigues dos Santos de jaqueta) — esta gente sem moral que nos entra casa adentro para nos interpretar o mundo. Um amador de economia surge de guia nativo. Uma assombração em fato de treino fala com mortos, um outro soube de um avião que não caiu… Todos sabem de pinheiros e eucaliptos, de ordenamento do território… Amanhã estarão a explicar-nos as causas do défice, as mudanças do clima no planeta, os interesses que se jogam no Médio Oriente, a estratégia das três grandes potências para a divisão do mundo.

Serão os pastores evangélicos que vimos de microfone a aproveitarem sem vergonha a desgraça alheia e os seus sentimentos de impotência, ou de raiva, ou de desespero que se despiram diante de nós. A reflexão mais elaborada sobre os assuntos que determinam a nossa vida, o máximo de senso, de honestidade, de saber da vida e do mundo que estas figuras patétitas conseguem é a que apresentaram em Fátima, no 13 de maio, na rotunda do Marquês no dito tetra e agora em Pedrógão. É esta gente que nos interpretará o Brexit, a crise dos refugiados, a nova Europa, o programa espacial da China, as vagas migratórias, a guerra da Siria, as opções do novo governo francês, o desemprego estrutural, as opções para o futuro da segurança social, os novos combustíveis, o terrorismo. Serão estes evangelistas dos últimos dias que entrevistarão ministros e cientistas, que analisarão orçamentos e os fenómenos sociais que determinam o nosso presente e o nosso futuro!

Como respondeu uma vendedora na feira de Carcavelos quando um senhor ali caído por acaso lhe perguntou se os polos eram mesmo da Lacoste: Aqui é tudo de marca!

O incêndio de Pedrógão provou que as televisões são uma feira de Carcavelos. Tudo ali é contrafeito e rasca, mas amanhã, os que ali se exibiram como vendedores de Lacostes surgirão graves e sérios como se fossem fabricantes de produtos originais.
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Um texto escrito por um escritor e capitão de Abril e enviado por outro escritor, também capitão de Abril, o meu amigo e antigo colega de liceu, o Diamantino Silva.
E aproveito a ocasião, da presença, aqui, destes dois militares, cuja honestidade intelectual e integridade moral muito admiro, para dizer o seguinte:
Os capitães de Abril traziam nos olhos a pureza genuína da política, que os políticos de regime depressa conspurcaram.
Alexandre de Castro
2017 07 03