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domingo, 30 de março de 2014

Queremos criar empregos? Saiamos do euro e da UE - por Joan Tafalla


Tal como em Portugal, em Espanha o desemprego é uma consequência direta  da crise de uma Europa que abandonou o discurso da solidariedade e do crescimento e o substituiu pela política do saque aos países da periferia.
Através deste estudo de Joan Tafalla, percebe-se que se trata de um fenómenos estrutural, ligado às contradições do capitalismo, e não de um efeito conjuntural.
Ver aqui.

quinta-feira, 27 de março de 2014

O medo como arma política


Ele foi o medo da bancarrota, o medo da falência da Segurança Social, o medo do fim do Estado social, o medo dos retrocessos nos direitos e nos avanços civilizacionais e o medo permanente suscitado pelo anúncio de medidas muitíssimo negativas para depois serem aplicadas menos umas décimas de austeridade. O objetivo é o de gerar a resignação, o conformismo e o alívio por o corte realizado ser ligeiramente abaixo do previsto. Podia ter sido pior, pensam alguns.
Outra das linhas do medo é a do fomento das divisões entre os portugueses tendo por base a inveja e a denúncia de alegados privilégios, enquanto as grandes fortunas aumentam mais de 14% em 2013. Colocar os mais jovens contra os idosos, os trabalhadores do setor privado contra os funcionários públicos, os que têm apoios sociais contra os que não têm, os do interior contra os do litoral, sempre numa lógica divisionista insuscetível de gerar qualquer mobilização dos portugueses para saírem da crise.
Outra das linhas do medo é a da consagração da incerteza como a tónica que pontua a vida de milhares de portugueses, incerteza em relação aos rendimentos do trabalho, às reformas e às pensões, incerteza em relação aos serviços prestados pelo Estado e incerteza generalizada em relação ao futuro. Medo que não chegue, medo que não tenha ou simplesmente medo. O Governo desregulou as nossas vidas, numa espécie de mimetização com o funcionamento da globalização e numa deriva de aproximação aos modelos de sociedade com respostas de protecção social mais débeis, conformadas com a colocação de cidadãos na rota da exclusão social e da pobreza.
António Galamba
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A política da subliminar difusão e instalação do medo tem os mesmos efeitos perversos das políticas de terra queimada.
Salazar criou a PIDE e desencadiou uma violenta repressão silenciosa para amedrontar os portugueses. Passos Coelho, um aventureiro sem escrúpulos e sem moral, escolheu a iminente ameaça do caos, a divisão entre as classes sociais e os grupos profissionais  e a incerteza sobre futuro, cujo invisível modelo foi inspirado nos  manuais de tortura da CIA. Desmoralizar primeiro, dividir a seguir, para depois impunemente atacar.

quarta-feira, 26 de março de 2014

Economistas defendem saída da Alemanha e França do euro


Sete economistas europeus, incluindo o português João Ferreira do Amaral, defendem que a Alemanha e a França devem abandonar a união monetária, pois só assim o euro é sustentável para os restantes Estados-membros, escreve o Jornal de Negócios.
A ideia é defendida num texto publicado no Project Syndicate, um dos sites mais conceituados de opinião.
http://pub.sapo.pt/lg.php?bannerid=150837&campaignid=91049&zoneid=2925&loc=1&referer=http%3A%2F%2Fwww.noticiasaominuto.com%2Feconomia%2F194466%2Feconomistas-defendem-saida-da-alemanha-e-franca-do-euro&cb=8be185016aO português João Ferreira do Amaral, o alemão Hans-Olaf Henkel e o francês Jean-Pierre Vesperini são três dos sete signatários do texto que defende o desmantelamento da zona euro. Esta seria a solução necessária a adotar para que “nenhum país ou grupo de países” seja obrigado a “suportar o peso do ajustamento”.
Para os economistas este desmantelamento pode até “revigorar o ideal europeu”.
“A chave é assegurar que ela [a ideia do desmantelamento] surja do núcleo económico e político da União Europeia”. Isto é, “a Alemanha, maior potência económica da Europa, e a França, progenitora intelectual da unificação europeia, devem anunciar a sua saída simultânea do euro e a readoção do marco e do franco”, lê-se no texto citado pelo Jornal de Negócios.
Para os signatários do texto, “isso provocaria a reapreciação imediata do marco – e possivelmente do franco - em relação ao euro”. E não significaria que os restantes países tivessem de abandonar a união monetária, isso seria uma decisão de cada um.
“Os outros países membros teriam de decidir se querem manter o euro na sua forma amputada ou regressar às suas moedas nacionais, possivelmente atreladas ao marco ou ao franco. Independentemente da sua decisão, a competitividade dos preços das economias mais fracas da Zona Euro iria melhorar consideravelmente”, explicam.
Consulte aqui o texto dos economistas

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Se esta proposta, a da saída da Alemanha e da França do euro, fosse adotada, todas as economias da zona euro saiam beneficiadas, pois permitiria a cada país escolher a situação que mais lhe conviesse. O franco e o marco valorizar-se-iam, possibilitando o afluxo de capitais para as bolsas de valores daqueles dois países, que viam assim aumentar a sua liquidez, fator importante para o aumento de investimento na economia produtiva e, consequentemente, para a diminuição do desemprego.
Os países extremamente endividados com o exterior, situação em que se encontram Portugal e a Grécia, só beneficiariam com o regresso às suas antigas moedas, o que permitiria proceder a um ajustamento cambial equilibrado, a fim das suas respetivas economias ganharem elevada competitividade, essencial para obter saldos robustos com o exterior. O aumento da produção, induzido por esta forma, também iria refletir-se, a nível orçamental, na formação de saldos primários elevados, única forma de arranjar dinheiro para pagar as dívidas soberanas respetivas, sem ter de recorrer ao inferno de decretar mais austeridade.
Os restantes países, nivelados em termos de competitividade, talvez lhe conviesse a manutenção do euro.
Com este modelo, a Alemanha e a França beneficiavam imediatamente com a mudança de moeda. Portugal, a Grécia e, caso também adotassem a antiga moeda nacional, a Espanha e a Itália, beneficiariam a longo prazo. O terceiro grupo de países, os que se mantivessem com a moeda única, os benefícios apareceriam a médio prazo.
Trata-se de uma proposta revolucionária, que iria corrigir muitos problemas estruturais da zona euro, sendo o principal a rigidez cambial de uma moeda muito valorizada, o que provocou muitas entorses nas economias dos países periféricos, onde se destaca o excessivo endividamento a que foram obrigadas.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Banco de Fomento e a nova Cartilha dos Marialvas...

Banco de sentar

Pagámos muito para salvar os bancos, continuamos a salvar banqueiros

No início do seu trajecto como candidato a líder do PSD, Pedro Passos Coelho apareceu com uma proposta fulminante – o homem que queria fazer o Estado desaparecer das nossas vidas, desejava naturalmente, privatizar a Caixa Geral de Depósitos. Perante o clamor nacional, Passos mudou de ideias. Afinal, "a Caixa era a Caixa" e nunca lhe tinha passado pela cabeça a relação especial que os portugueses mantinham com "a Caixa".
Agora, o governo decidiu criar um segundo banco público. Desta vez, é um Banco de Fomento que vai ajudar a conceder crédito às empresas. A ideia até tem o apoio do PS que a defendeu antes do governo. Alguns economistas – como o insuspeito Mira Amaral – defendem que o que este banco vai fazer podia perfeitamente ser feito pela Caixa Geral de Depósitos, um organismo que faz de público em determinadas ocasiões e de "banco comercial" em outras.
Mas lá se avançou para a comissão instaladora do Banco de Fomento, que irá revolucionar a economia portuguesa (como se alguma coisa, infelizmente, conseguisse fazer isso perante as obtusas regras europeias a que estamos obrigados). Acontece que os vencimentos anunciados para os membros da comissão instaladora do banco público revelam mais uma vez ao mundo que as "gorduras do Estado" que o governo jurou combater eram a arraia-miúda, os reformados e os funcionários públicos. As "gorduras" do Estado eram os serviços públicos e os pensionistas com reformas acima dos 600 euros. Não há dinheiro para nada, mas há dinheiro para pagar quase meio milhão de euros a três criaturas que vão "instalar" o segundo banco público do país. Maria Antonieta também pensava assim.
O argumento de que se tem de pagar muito bem porque se tem de ir buscar "os melhores" é iníquo no meio da devastação social a que o país está sujeito. E quem são os melhores? E onde está a lei que tinha travado salários no Estado superiores aos do Presidente da República? E se é suposto que um primeiro-ministro seja "um dos melhores" porque lhe é imposto um rendimento tão baixo em comparação com o banqueiro? Até aqui, pagámos muito (com uma crise e desemprego elevado) para salvar os bancos. Continuamos a salvar banqueiros. Os cortes que vêm aí não vão incidir sobre o salário destes novos banqueiros públicos – vão voltar aos do costume, aos ricos que têm rendimentos de 1000 euros brutos. Anda-se a brincar com o fogo.
Ana Sá Lopes
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Não são apenas os vencimentos dos três administradores do futuro Banco de Fomento que roçam a obscenidade. O maior escândalo virá a seguir, com a admissão de centenas de funcionários, para lhe dar corpo. Os jotinhas do PSD já salivam de ansiedade, enquanto vão embelezando os currículos com dezenas de certificados de presença  em simpósios e diplomas de frequência de cursos de marketing, que, por si só, já são verdadeiros produtos do marketing, destinados a satisfazer, pese embora a sua inutilidade, a magreza e a penúria curriculares. Finalmente, o partido irá pagar-lhes a fidelidade canina e o trabalho desenvolvido nas campanhas eleitorais em que participaram com garboso entusiasmo, quer na encenação gloriosa dos comícios políticos, quer enfileirando nas barulhentas caravanas de automóveis, a acenar as bandeiras laranja, da setinha virada para cima.
Os barões do partido vão começar a puxar dos seus galões, para tentar encaixar um sobrinho ou um filho de um amigo, a quem se deve um favor. Os economistas, esses virão todos da Católica, onde são bem industriados na cartilha neoliberal e com a garantia higiénica de não trazerem nos neurónios a mácula de contágio com as ideias subversivas dos perigosos economistas marxistas e neokeynesianos.
Mais um gasto supérfluo e desnecessário de milhões de euros, para dar emprego à numerosa clientela partidária.
A Caixa Geral de Depósitos, o banco do Estado, que tem experiência no ramo do crédito às empresas e beneficia de um grande prestígio institucional e de uma grande implantação em todo o território nacional, seria a instituição bancária mais vocacionada para desenvolver a missão do tal Banco de Fomento.
AC  

terça-feira, 18 de março de 2014

Não será a troika que virá a Portugal, mas será Portugal que irá à troika...


Ajustamento Passos e Merkel almoçam hoje em Berlim com pós-troika na ementa
O primeiro-ministro Pedro Passos Coelho encontra-se hoje com Angela Merkel, em Berlim, para discutir a melhor opção para a saída portuguesa do programa de assistência financeira. Depois da reunião com Seguro, o encontro com a chanceler alemã dá continuidade à contagem decrescente para a preparação do pós-troika.

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Se houvesse dúvidas de quem, na realidade, manda na política portuguesa, esta iniciativa de Passos Coelho dissipa-as. Ele vai simplesmente a despacho, a Berlim.
A escolha da designação e do método para o período pós-troika é supérfluo e enganador. A escolha apenas está a ser preparada para efeitos eleitoralistas. O essencial – mais austeridade – já está há muito definido. 
Não será a troika que virá a Portugal, mas será Portugal que irá à troika. ­­

Humor: SALTA!... SALTA!...


Comentários interessantes:

Manuel Bernardo Campos Costa: “Infelizmente está surdo”.

Leonilde Santos: "Não és homem não és nada se não saltares. Vamos lá força que o povo dá-te todo o apoio!...

domingo, 16 de março de 2014

Jerónimo de Sousa defende que Manifesto dos 70 é "tardio"


O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, afirmou hoje, no Porto, que o manifesto subscrito por 70 personalidades é "tardio", mas vem confirmar a necessidade "urgente" da renegociação da dívida e a rutura com o atual rumo político.
No comício comemorativo do 93.º aniversário do partido, o líder comunista salientou que o manifesto conclui a necessidade "imediata" do país renegociar a sua dívida pública, reconhecendo a natureza insustentável da dívida e as consequências devastadoras que lhe estão associadas.
"Uma renegociação que, para o PCP, deve ser assumida por iniciativa do Estado português, na plenitude do direito soberano da salvaguarda dos interesses do país e do povo, assente num serviço de dívida compatível com o crescimento económico e a promoção do emprego, tendo como objetivo a sustentabilidade da divida no medio e longo prazo", referiu.

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O Manifesto dos 70 é tardio e opta por uma solução minimalista. Perante o gigantismo da dívida do Estado português, a sua “reestruturação” (alongamento das maturidades e abaixamento de juros) já é insuficiente. Neste momento, em que a perspetiva futura de bancarrota se apresenta como provável, a solução também passa pelo perdão de parte dessa dívida, através da sua “renegociação”, tal como propôs o PCP, já em 2011, e que não é nenhuma novidade nas relações financeiras entre Estados soberanos. A própria Alemanha beneficiou da benevolência dos seus credores, onde constava a Grécia, que lhe perdoaram cerca da metade da dívida soberana e lhe alongaram os prazos de maturidade.
Mas, apesar destas insuficiências, o manifesto teve o mérito de mostrar as brechas que já estão a abrir-se no setor da direita e a ampliar na opinião pública o ceticismo em relação à política de austeridade seguida pelo governo. Embora tardiamente, as pessoas começam a perceber que os sacrifícios vieram para ficar, e com a agravante de não conduzirem a lado nenhum, a não ser à pobreza endémica da maior parte da população.
O manifesto, uma vez que cruza subscritores de vários quadrantes ideológicos, tem dois tempos com marcas identitárias diferentes. O primeiro, o da análise económica, aliás, bem sucedida, tem a marca das personalidades mais à esquerda, onde se vislumbra a mão dos economistas neo-Keynesianos. O segundo, o das soluções propostas, tem a influência das personalidades de direita, que evitaram qualquer referência explícita ao governo, que apenas implicitamente é criticado.

Estou cansado, pá - Vernáculo

Amabilidade de Diamantino Silva
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sábado, 15 de março de 2014

Candeia que vai à frente alumia duas vezes

O Eurostat já corrigiu o valor da dívida, em 2013, para 129,3 % do PIB 

A bancada do PCP assumiu naquele debate [sessão parlamentar de 11 de Março] e, mais tarde, numa declaração política própria, que já propôs a renegociação da dívida a 5 de Abril de 2011, há três anos, o que na altura foi considerado “irresponsável e irrealista”, nas palavras do deputado Paulo Sá. “Foi preciso que a vida dos portugueses tivesse sido arruinada (…), foi preciso que a dívida tivesse disparado para quase 130% do PIB para que certos sectores da nossa sociedade se convencessem, talvez a contragosto, da justeza das propostas do PCP”, afirmou o parlamentar comunista.
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É sempre difícil, antes do tempo, demonstrar que se tem toda a razão...

sexta-feira, 14 de março de 2014

Manifesto dos 70


Manifesto: Preparar a reestruturação da dívida para crescer sustentadamente (na íntegra)

Nenhuma estratégia de combate à crise poderá ter êxito se não conciliar a resposta à questão da dívida com a efectivação de um robusto processo de crescimento económico e de emprego num quadro de coesão e efectiva solidariedade nacional. Todos estes aspectos têm de estar presentes e actuantes em estreita sinergia. A reestruturação da dívida é condição sine qua non para o alcance desses objectivos.
O que reúne aqui e agora os signatários, que têm posições diversas sobre as estratégias que devem ser seguidas para responder à crise económica e social, mas que partilham a mesma preocupação quanto ao peso da dívida e à gravidade dos constrangimentos impostos à economia portuguesa, é tão-somente uma tomada de posição sobre uma questão prévia, a da identificação das condições a que deve obedecer um processo eficaz de reestruturação.
O que a seguir se propõe tem sempre em atenção a necessidade de prosseguir as melhores práticas de rigorosa gestão orçamental no respeito das normas constitucionais, bem como a discussão de formas de reestruturação honrada e responsável da dívida no âmbito de funcionamento da União Económica e Monetária, nos termos adiante desenvolvidos.

A actual dívida é insustentável na ausência de robusto e sustentado crescimento
A crise internacional iniciada em 2008 conduziu, entre outros factores de desequilíbrio, ao crescimento sem precedentes da dívida pública. No biénio anterior, o peso da dívida em relação ao PIB subira 0,7 pontos percentuais, mas elevou-se em 15 pontos percentuais no primeiro biénio da crise. No final de 2013 a dívida pública era de 129% do PIB e a líquida de depósitos de cerca de 120%. O endividamento externo público e privado ascendeu a 225% do PIB e o endividamento consolidado do sector empresarial a mais de 155% do PIB. A resolução da questão da dívida pública não só se impõe pelas suas finalidades directas, como pela ajuda que pode dar à criação de condições favoráveis à resolução dos problemas específicos do endividamento externo e do sector empresarial, que são igualmente graves.
 A dívida pública tornar-se-á insustentável na ausência de crescimento duradouro significativo: seriam necessários saldos orçamentais primários verdadeiramente excepcionais, insusceptíveis de imposição prolongada.
A nossa competitividade tem uma base qualitativa demasiado frágil para enfrentar no futuro a intensificação da concorrência global. É preciso uma profunda viragem, rumo a especializações competitivas geradas pela qualidade, pela inovação, pela alta produtividade dos factores de produção envolvidos e pela sagaz capacidade de penetração comercial em cadeias internacionais ou nichos de mercado garantes de elevado valor acrescentado.
Trata-se certamente de um caminho difícil e de resultados diferidos no tempo. A sua materialização exige continuidade de acção, coerência de estratégias públicas e privadas, mobilização contínua de elevado volume de recursos, bem como de cooperação nos mais diversos campos de actividade económica, social e política. Será tanto mais possível assegurar a sustentabilidade da dívida, quanto mais vigoroso for o nosso empenho colectivo no aproveitamento das oportunidades abertas pela reestruturação no sentido de promover esse novo padrão de crescimento.

É imprescindível reestruturar a dívida para crescer, mantendo o respeito pelas normas constitucionais
Deixemo-nos de inconsequentes optimismos: sem a reestruturação da dívida pública não será possível libertar e canalizar recursos minimamente suficientes a favor do crescimento, nem sequer fazê-lo beneficiar da concertação de propósitos imprescindível para o seu êxito. Esta questão é vital tanto para o sector público como para o privado, se se quiser que um e outro cumpram a sua missão na esfera em que cada um deles é insubstituível.
Sem reestruturação da dívida, o Estado continuará enredado e tolhido na vã tentativa de resolver os problemas do défice orçamental e da dívida pública pela única via da austeridade. Deste modo, em vez de os ver resolvidos, assistiremos muito provavelmente ao seu agravamento em paralelo com a acentuada degradação dos serviços e prestações provisionados pelo sector público. Subsistirá o desemprego a níveis inaceitáveis, agravar-se-á a precariedade do trabalho, desvitalizar-se-á o país em consequência da emigração de jovens qualificados, crescerão os elevados custos humanos da crise, multiplicar-se-ão as desigualdades, de tudo resultando considerável reforço dos riscos de instabilidade política e de conflitualidade social, com os inerentes custos para todos os portugueses.
Por outro lado, a economia sofrerá simultaneamente constrangimentos acrescidos, impeditivos em múltiplas dimensões do desejável crescimento do investimento, da capacidade produtiva e da produtividade, nomeadamente pela queda da procura e desestruturação do mercado, diminuição da capacidade de autofinanciamento, degradação das condições de acesso, senão mesmo rarefacção do crédito da banca nacional e internacional, crescente liquidação de possibilidades competitivas por défice de investimento e inovação. Por maioria de razões, o ganho sustentado de posições de referência na exportação ficará em risco e inúmeras empresas ver-se-ão compelidas a reduzir efectivos.
Há que encontrar outros caminhos que nos permitam progredir. Esses caminhos passam pela desejável reestruturação responsável da dívida através de processos inseridos no quadro institucional europeu de conjugação entre solidariedade e responsabilidade.
Há alternativa.

A reestruturação deve ocorrer no espaço institucional europeu
No futuro próximo, os processos de reestruturação das dívidas de Portugal e de outros países – Portugal não é caso único – deverão ocorrer no espaço institucional europeu, embora provavelmente a contragosto, designadamente dos responsáveis alemães. Mas reacções a contragosto dos responsáveis alemães não se traduzem necessariamente em posições de veto irreversível. Veja-se o que vem sucedendo com a Grécia, caso irrepetível, de natureza muito diferente e muito mais grave, mas que ajuda a compreender a lógica comportamental dos líderes europeus. Para o que apontam é para intervenções que pecam por serem demasiado tardias e excessivamente curtas ou desequilibradas. Se este tipo de intervenções se mantiver, a União Europeia correrá sérios riscos.
Portugal, por mais que cumpra as boas práticas de rigor orçamental de acordo com as normas constitucionais – e deve fazê-lo sem hesitação, sublinhe-se bem –, não conseguirá superar por si só a falta dos instrumentos que lhe estão interditos por força da perda de soberania monetária e cambial. Um país aderente ao euro não pode ganhar competitividade através da política cambial, não lhe é possível beneficiar directamente da inflação para reduzir o peso real da sua dívida, não pode recorrer à política monetária para contrariar a contracção induzida pelo ajustamento e não tem banco central próprio que possa agir como emprestador de último recurso. Mas se o euro, por um lado, cerceia a possibilidade de uma solução no âmbito nacional, por outro, convoca poderosamente a cooperação entre todos os Estados-membros aderentes. A razão é simples e incontornável: o eventual incumprimento por parte de um país do euro acarretaria, em última instância, custos difíceis de calcular, mas provavelmente elevados, incidindo sobre outros países e sobre o próprio euro. Prevenir as consequências nefastas desta eventualidade é, de facto, um objectivo de interesse comum que não pode ser ignorado.
 Após a entrada em funções da nova Comissão Europeia, deverá estar na agenda europeia o início de negociações de um acordo de amortização da dívida pública excessiva, no âmbito do funcionamento das instituições europeias. Na realidade, esse processo já foi lançado e em breve iniciará o seu caminho no contexto do diálogo interinstitucional europeu, entre Comissão, Conselho e Parlamento. É essencial que desse diálogo resultem condições fundamentais para defender sem falhas a democracia nos Estados-membros afectados, como valor fundacional da própria União.

Três condições a que a reestruturação deve obedecer
A Comissão Europeia mandatou um grupo de peritos para apresentar, designadamente, propostas de criação de um fundo europeu de amortização da dívida. O seu relatório será publicado antes das próximas eleições para o Parlamento Europeu. Essas propostas juntar-se-ão a várias outras formuladas nos últimos quatro anos. Recorde-se que a presente tomada de posição visa apenas a questão prévia da identificação das condições a que deve obedecer um processo eficaz de reestruturação. Serve-nos de guia o exposto sobre a dívida portuguesa, mas pensamos que as condições adiante sugeridas defendem também os melhores interesses comuns dos países do euro.
Tendo presente que a capacidade para trazer a dívida ao valor de referência de 60% do PIB depende fundamentalmente de três variáveis (saldo orçamental primário, taxa de juro implícita do stock de dívida e taxa nominal de crescimento da economia), identificam-se três condições a que deve obedecer a reestruturação da dívida.

1) Abaixamento da taxa média de juro
A primeira condição é o abaixamento significativo da taxa média de juro do stock da dívida, de modo a aliviar a pesada punção dos recursos financeiros nacionais exercida pelos encargos com a dívida, bem como ultrapassar o risco de baixas taxas de crescimento, difíceis de evitar nos próximos anos face aos resultados diferidos das mudanças estruturais necessárias. O actual pano de fundo é elucidativo: os juros da dívida pública directa absorvem 4,5%. do PIB. Atente-se ainda no facto de quase metade da subida da dívida pública nos últimos anos ter sido devida ao efeito dos juros.

2) Alongamento dos prazos da dívida
A segunda condição é a extensão das maturidades da dívida para 40 ou mais anos. A nossa dívida tem picos violentos. De agora até 2017 o reembolso da dívida de médio e longo prazo atingirá cerca de 48 mil milhões de euros. Alongamentos da mesma ordem de grandeza relativa têm respeitáveis antecedentes históricos, um dos quais ocorreu em benefício da própria Alemanha. Pelo Acordo de Londres sobre a Dívida Externa Alemã, de 27 de Fevereiro de 1953, a dívida externa alemã anterior à II Guerra Mundial foi perdoada em 46% e a posterior à II Guerra em 51,2%. Do remanescente, 17% ficaram a juro zero e 38% a juro de 2,5% Os juros devidos desde 1934 foram igualmente perdoados. Foi também acordado um período de carência de cinco anos e limitadas as responsabilidades anuais futuras ao máximo de 5% das exportações no mesmo ano. O último pagamento só foi feito depois da reunificação alemã, cerca de cinco décadas depois do Acordo de Londres. O princípio expresso do Acordo era assegurar a prosperidade futura do povo alemão, em nome do interesse comum. Reputados historiadores económicos alemães são claros em considerar que este excepcional arranjo é a verdadeira origem do milagre económico da Alemanha. O Reino Unido, que alongou por décadas e décadas o pagamento de dívidas suas, oferece outro exemplo. Mesmo na zona euro, já se estudam prazos de 50 anos para a Grécia. Portugal não espera os perdões de dívida e a extraordinária cornucópia de benesses então concedida à Alemanha, mas os actuais líderes europeus devem ter presente a razão de ser desse Acordo: o interesse comum. No actual contexto, Portugal pode e deve, por interesse próprio, responsabilizar-se pela sua dívida, nos termos propostos, visando sempre assegurar o crescimento económico e a defesa do bem-estar vital da sua população, em condições que são também do interesse comum a todos os membros do euro.

3) Reestruturar, pelo menos, a dívida acima de 60% do PIB
Há que estabelecer qual a parte da dívida abrangida pelo processo especial de reestruturação no âmbito institucional europeu. O critério de Maastricht fixa o limite da dívida em 60% do PIB. É diversa a composição e volume das dívidas nacionais. Como é natural, as soluções a acordar devem reflectir essa diversidade. A reestruturação deve ter na base a dívida ao sector oficial, se necessário complementada por outras responsabilidades de tal modo que a reestruturação incida, em regra, sobre dívida acima de 60% do PIB. Nestes termos, mesmo a própria Alemanha poderia beneficiar deste novo mecanismo institucional, tal como vários outros países da Europa do Norte.
Os mecanismos da reestruturação devem instituir processos necessários à recuperação das economias afectadas pela austeridade e a recessão, tendo em atenção a sua capacidade de pagamento em harmonia com o favorecimento do crescimento económico e do emprego num contexto de coesão nacional. Se forem observadas as três condições acima enunciadas, então será possível uma solução no quadro da União e da zona euro com um aproveitamento máximo do quadro jurídico e institucional existente.
A celeridade da aprovação e entrada em funcionamento do regime de reestruturação é vital. A única maneira de acelerar essa negociação é colocá-la desde o início no terreno firme do aproveitamento máximo da cooperação entre Estados-membros, de modo a acolher o alongamento do prazo de reestruturação, a necessária redução de juros e a gestão financeira da reestruturação, tendo em atenção as finalidades visadas pelos mecanismos de reestruturação.
Cada país integraria em conta exclusivamente sua a dívida a transferir e pagaria as suas responsabilidades, por exemplo, mediante a transferência de anuidades de montantes e condições pré-determinadas adequadas à capacidade de pagamento do devedor. As condições do acordo a estabelecer garantiriam a sua estabilidade, tendo em conta as responsabilidades assumidas por cada Estado-membro. Deste modo, a uma sã e rigorosa gestão orçamental no respeito das normas constitucionais acresceria o contributo da cooperação europeia assim orientada. As condições relativas a taxas de juro, prazos e montantes abrangidos devem ser moduladas conjugadamente, a fim de obter a redução significativa do impacto dos encargos com a dívida no défice da balança de rendimentos do país e a sustentabilidade da dívida pública, bem como a criação de condições decisivas favoráveis à resolução dos constrangimentos impostos pelo endividamento do sector empresarial público e privado e pelo pesado endividamento externo.
O processo de reestruturação das dívidas públicas já foi lançado pela Comissão Europeia. Fomos claros quanto a condições a que deve obedecer esse processo. A sua defesa desde o início é essencial. O nosso alheamento pode vir a ser fatal para o interesse nacional
A reestruturação adequada da dívida abrirá uma oportunidade ímpar, geradora de responsabilidade colectiva, respeitadora da dignidade dos portugueses e mobilizadora dos seus melhores esforços a favor da recuperação da economia e do emprego e do desenvolvimento sustentável com democracia e responsabilidade social.
Por quanto ficou dito, os signatários reiteram a sua convicção de que a estratégia de saída sustentada da crise exige a estreita harmonização das nossas responsabilidades em dívida com um crescimento duradouro no quadro de reforçada coesão e solidariedade nacional e europeia.
Estes são os termos em que os signatários apelam ao debate e à preparação, em prazo útil, das melhores soluções para a reestruturação da dívida.

Adriano Moreira
Adalberto Campos Fernandes 
Adriano Pimpão
Alberto Ramalheira
Alberto Regueira
Alexandre Quintanilha
Alfredo Bruto da Costa
André Machado
António Bagão Félix
António Capucho
António Carlos Santos
António Eira Leitão
António Sampaio da Nóvoa
António Saraiva
Armando Sevinate Pinto
Artur Castro Neves
Boaventura Sousa Santos
Carlos César
Carlos Moreno
Constantino Sakellarides
Diogo Freitas do Amaral
Eduardo Cabrita
Eduardo Ferro Rodrigues
Eduardo Paz Ferreira
Emanuel Santos
Esmeralda Dourado
Eugénio Fonseca
Fausto Quadros
Fernanda Rolo
Fernando Gomes da Silva
Fernando Rosas
Francisco Louçã
Henrique Neto
João Cravinho
João Galamba
João Vieira Lopes
Joaquim  Gomes Canotilho
Jorge Malheiros
Jorge Novais
José Almeida Serra
José Maria Brandão de Brito
José Maria Castro Caldas
José Reis
José Silva Lopes
José Vera Jardim
José Tribolet
Júlio Mota
Luís Braga da Cruz
Luís Nazaré
Luís Veiga da Cunha
Manuel Carvalho da Silva
Manuel  de Lemos
Manuel Macaísta Malheiros
Manuel Porto
Manuel Sobrinho Simões
Manuela Arcanjo
Manuela Ferreira Leite
Manuela Morgado
Manuela Silva
Mariana Mortágua
Paulo Trigo Pereira
Pedro Adão e Silva
Pedro Bacelar de Vasconcelos
Pedro Delgado Alves
Pedro Lains
Pedro Marques Lopes
Ricardo Bayão Horta
Ricardo Cabral
Ricardo Paes Mamede
Rui Marques
Teresa Pizarro Beleza
Viriato Soromenho-Marques
Vítor Martins
Vítor Ramalho

In PÚBLICO 11/03/2014

Ucrânia: À Europa, Saiu o Tiro Pela Culatra

 

Putine passou de bestial a besta em menos de 24 horas. De grande estrela organizadora dos Jogos Olímpicos de Sotchi, autêntica medalha de ouro da modalidade de contra-terrorismo, capa de variadíssimas publicações ocidentais durante quinze dias, Putine passou a ser o urso que ameaça devorar o mundo. Há, claro, em tudo isto (como diria Mark Twain a propósito das notícias sobre a sua morte), algum exagero e também alguma má-fé e muita ignorância.

As razões geopolíticas do afrontamento na “terra da fronteira” (significado literal de Ucrânia) são conhecidas de todos os que se interessam (mesmo pouco que seja) pela geopolítica. Mario Draghi confessou, a propósito, há uns dias, que a geopolítica era algo que estava para lá do alcance de “um pobre banqueiro central”… Mas esqueceu-se de referir (ou não sabia) que nenhum banqueiro central (pobre ou não…) está para além do alcance da geopolítica.

George Friedman, para só citar um nome conhecido dos leitores do “IE”, há anos que vinha a antecipar, em público, os actuais acontecimentos da Ucrânia (e outros da Europa e da Rússia) e, ao longo de 2013, lançou vários alertas sobre o problema. Portanto, esta crise, como todas as crises, era antecipável e a prova é que houve quem a antecipasse, como o nosso referido amigo George Friedman.
Não há, portanto, aqui nenhuma surpresa (Friedman explicou há um ano como a reacção de Putine só poderia ser a que agora… foi!) e se algum dirigente político ocidental se diz surpreendido, então, só está a comprovar que não tem competência para o cargo que ocupa. Mas isso também já se sabia…

Que a Crimeia queira ser russa também não é um facto que possa surpreender, tendo em conta a história dos últimos séculos e a conjuntura estratégica das últimas décadas. Nem é, de resto, caso raro e muito menos único. Assim, de repente, para não falar da defunta Checoslováquia, nem da falecida Jugoslávia e outros Kosovos, bastará lembrar a velha guerra da Irlanda e, mais recente, a Escócia a querer separar-se do Reino Unido, a Flandres que quer sair da Bélgica, a Valónia que admite integrar-se na França, a Lombardia que não quer ser italiana e, mais perto de nós, o País Basco e a Catalunha que gritam não ser Espanha e pretendem viver a sua própria vida. E a Alemanha deverá olhar também um pouco para aquilo que é… O estado politicamente mais arcaico e frágil da Europa, permanentemente ameaçado de uma implosão que só a ocupação militar americana mantinha fora da agenda e que agora só o sucesso económico disfarça, a Alemanha ter em qualquer altura a sua Crimeia na…Baviera.

A Crimeia não é, portanto surpresa alguma, nem sequer uma história rara. Que as chancelarias da União Europeia sucumbam a um fatal cocktail de arrogância e ignorância, polvilhado de preguiça, é outra história, que tão pouco é rara mas, sim, muito comum. Que, tendo sucumbido a esse cocktail fatal, as chancelarias europeias sejam surpreendidas, pelo normal evoluir das dinâmicas que desencadeiam, tão pouco tem nada de surpreendente. Que estejam agora a ser assediadas pelos banqueiros que, levianamente e com muito desprezo pela geopolítica, se “expuseram” na Rússia mas sobretudo na Ucrânia (onde a exposição ascende a dezenas de milhares de milhões…) também não surpreende. Aliás, seria o contrário que surpreenderia. Tal como surpreenderia que a União Europeia não mobilize já umas dezenas de milhares de milhões (do
dinheiro dos contribuintes, claro) para correr “ajudar” (a fundo perdido) a Ucrânia a pagar aos bancos europeus, para que estes não percam os seus fundos. O dinheiro, aliás, nem avistará terras da Ucrânia, passará directamente dos bolsos dos contribuintes para os cofres dos bancos. Claro, tudo isto precisa de um discurso justificativo e até apologético. A guerra económica dos bancos pela recuperação dos seus fundos precisa de uma boa guerra de informação… E ela aí está que já transformou em ouro devorador a medalha olímpica do contra-terrorismo de Sotchi. Até os editoriais de um “Economist”, outrora tão lúcido, cheiram a propaganda barata…

A questão estratégica, porém, é outra. A Rússia é o jovem Estado que sucedeu à União Soviética (embora tenha perdido territórios e populações). Como jovem Estado está a iniciar o seu percurso e tem escolhas estratégicas a fazer. Escolhas que ditarão o seu futuro imediato e a longo prazo. Por exemplo, dizer que a Rússia deve escolher a democracia à ocidental é uma frase feita e totalmente
vazia. Oca. A Rússia, para escolher e construir a democracia à ocidental, precisa de ter um horizonte de integração no mundo euro-atlântico. De sentir e ver que essa integração não só é possível como é a melhor aposta em termos de desenvolvimento e segurança do jovem Estado russo. Ora, a “crise” da Ucrânia constitui-se em trauma para a Rússia que percepciona este conflito como a vontade da Alemanha, enquadrada por outros europeus e apoiada por Washington, de desestabilizar as fronteiras russas, instalar-se aí e obter o controlo do Mar Negro, barrando a Moscovo a sua única via de acesso ao Mediterrâneo. Bem ou mal, a Rússia percepciona a Ucrânia como um Estado-tampão essencial à sua defesa. Isso é um facto. Um facto real e estratégico que, sendo tal, não pode ser ignorado, como o foi pelas chancelarias europeias. Moscovo considera que, dada a sua geografia e a sua história, a transformação
da Ucrânia num Estado sob influência de Berlim (com ou sem apoio de Washington) é uma gravíssima ameaça à sua segurança nacional e, como tal, não pode ser tolerável e, muito menos, tolerado. A reacção de Putine só podia, portanto, ter a natureza que teve…

A sua recentíssima declaração de que pretende uma “solução diplomática”, mais do que apaziguadora pode ser muito preocupante e tem várias leituras possíveis mas concordantes e mesmo complementares.

Primeiro, Putine sente que já está montado um sistema suficiente de forças na Crimeia e que, resolvido esse problema de terreno, é agora tempo de começar a “conversar”;

Segundo, Putine não acredita em “soluções diplomáticas” mas as forças no terreno, tanto na Crimeia como em todo o leste da Ucrânia, são já suficientes para aguentar embates com as milícias e as tropas deste governo anti-russo de Kiev;

Terceiro, não havendo soluções diplomáticas (e, obviamente, quanto menos elas forem possíveis mais ele chamará por elas…), Putine aceita uma “guerra prolongada” na Ucrânia (à imagem da ex-Jugoslávia), em que não empenhará tropas mas municiará abundantemente as milícias pró-russas, pelo menos enquanto não  houver intervenções estrangeiras;
Quarto, uma tal guerra civil na Ucrânia, uma estratégia de caos, desestabilizará não só a Ucrânia mas toda a região, será um imenso sarilho para a União Europeia, prejudicará gravemente os interesses americanos no Irão, Síria, Iraque, Afeganistão e outros, tornará o Mediterrâneo oriental uma autêntica zona de guerra, será uma bela vacina para outros Estados ex-soviéticos que apresentem veleidades anti russas e, last but not least, isto afastará, por décadas, Moscovo do mundo euro-atlântico colocando-o numa posição de radical desconfiança estratégica de todo o Ocidente e, particularmente, de Berlim;
Quinto, esta “estratégia caos” choca de frente com os interesses europeus de um próspero mercado de 45 milhões de consumidores ucranianos mas não belisca o interesse russo de ter na Ucrânia um Estado-tampão, que pode perfeitamente ser o campo de ruínas resultante de uma arrasadora guerra civil.

A Bruxelas, na Ucrânia, já está visto que lhe saiu o tiro pela culatra… Os estragos que isso provocará é o que ainda iremos ver. Como tudo isto pode ser visto, enquadrado e explorado no quadro da estratégia nacional portuguesa é algo a que só quem souber o que essa estratégia nacional poderá dar alguma resposta…
Inteligência Económica
10/03/2014

Amabilidade de Diamantino  Silva

sábado, 8 de março de 2014

Opinião: Quem são os nazis no governo ucraniano? - por Thierry Meyssan


As potências ocidentais reconheceram de imediato o governo ucraniano, instaurado como resultado de um golpe de Estado. Esse governo inclui vários membros de organizações aberta, e explicitamente, nazistas. Entre esses indivíduos, há três líderes que se distinguiram produzindo imagens que mostravam agressões e torturas falsas, para convencer à opinião pública da crueldade do presidente, democraticamente eleito, Viktor Yanukovich. Sem disfarçar, o secretário adjunto do Conselho de Segurança Nacional de Ucrânia reconhece que tem relações com al-Qaida.
Thierry Meyssan
REDE VOLTAIRE (Ver aqui)

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Com a cumplicidade ativa dos EUA, da Alemanha e da França (quem diria?), já amplamente demonstrada, pela primeira vez, na Europa, surge na Ucrânia um governo formado por membros de organizações fascistas, que se reclamam herdeiras dos ideais da nazismo.
Os objetivos dos países ocidentais, que reconheceram imediatamente um governo não eleito, que derrubou um governo eleito democraticamente, dirigem-se contra a Rússia, tentando assim impedir o seu acesso ao Mediterrâneo. O governo da Rússia, com o apoio unânime do seu Parlamento, fez o que tinha a fazer, e fez bem. Marcou claramente a sua posição.
AC

quinta-feira, 6 de março de 2014

Notas do meu rodapé:A charlatanice à solta


Belmiro de Azevedo "Salários só aumentam quando português fizer uma coisa igual"

O presidente do Conselho de Administração da Sonae, Belmiro de Azevedo, afirmou hoje que os salários em Portugal só podem aumentar quando os trabalhadores tiverem a mesma produtividade que, por exemplo, os alemães.
"Os salários só podem aumentar - e oxalá que isso aconteça -- quando, de facto, um trabalhador português fizer uma coisa igual, parecida, com um trabalhador alemão ou inglês, seja o que for", afirmou Belmiro de Azevedo, à margem da cerimónia de entrega dos diplomas dos finalistas do MBA Executivo da Porto Business School.
Notícias ao Minuto (ver texto completo da notícia)


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A charlatanice à solta

Pasmo de espanto como é que na seleta reunião da entrega dos diplomas aos finalistas do MBA Executivo da Porto Business School, pejada de economistas, ninguém tivesse corrigido a aleivosia do patrão da Sonae, sobre a sua errada definição de produtividde, que ele, por motivos ideológicos e de classe, focaliza exclusivamente no factor de produção, o trabalho, ignorando um outro factor, o investimento, que é é a grande alavanca do aumento da produtividade. Belmiro de Azevedo, ou já está senil, ou é ignorante ou, então, é um charlatão. Se está senil, não deveria ter sido convidado para uma reunião, que, em princípio, deveria caracterizar-se pelo rigor da linguagem económica. A segunda hipótese, a da crassa ignorância, também deveria ter ditado a sua exclusão. A terceira hipótese, a da charlatanice, remete-me para a dúvida se os dirigentes e responsáveis daquele MBA Executivo não passam também de uns grandes charlatães (ou charlatões, se preferirem).
A produtividade de uma economia mede-se pela razão do PIB em relação ao número de trabalhadores ativos, multiplicado pelo número total de horas de trabalho (PIB / nº de trabalhadores x nº de horas trabalhadas). Como se trata de uma fração, com numerador e denominador, qualquer pessoa percebe que a produtividade é tanto maior, quanto maior for a riqueza produzida e quanto menor for o número de horas trabalhadas. Num determinado ano, a produtividade em relação ao ano anterior aumentará se um mesmo número de trabalhadores, trabalhando o mesmo número de horas, produzir mais e (ou) melhores produtos e serviços (mais riqueza). Mas essa capacidade de aumentar riqueza depende quase exclusivamente de um dos factores da composição do PIB, o investimento (em novas tecnologias, que encurtem o tempo de trabalho para fabricar cada unidade dos produtos, na formação profissional dos trabalhadores, aumentando as suas capacidades produtivas, e na melhoria da gestão e do marketing). Também se poderia aumentar a produtividade, aumentando os horários de trabalho ou os ritmos de trabalho, que é o que está a acontecer em Portugal, atualmente. Mas tudo isto depende do empresário e não dos trabalhadores, que cumprem (não têm outro remédio) os horários e os ritmos de trabalho que lhes são impostos. Ora a produtividade tem sido, desde sempre, o calcanhar de Aquiles da economia portuguesa, e isto porque os empresários não arriscam em investimentos focalizados na inovação, que aumentem a produtividade e, consequentemente, a competitividade.
Neste sentido, pode dizer-se que os nossos empresários foram e são parasitas, pois só pensam em aumentar a produtividade à custa do aumento dos tempos de trabalho e aumentar a produtividade à custa da desvalorização salarial (menores custos de trabalho). Apesar de ser o homem mais rico de Portugal, Belmiro de Azevedo é um deles, pois só aposta em negócios de pouco risco e de pouco valor acrescentado (devido à baixa produtividade), mas que lhe proporciona elevados lucros, devido aos baixos salários.

Paulo Morais: Deputados acusados de corrupção...

Amabilidade de Joaquim Pereira da Silva
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Isto já não vai lá, através dos votos. Cada vez mais defendo a solução radical.

terça-feira, 4 de março de 2014

O caminho para a 3ª Guerra Mundial


Amabilidade de João Fráguas

A propósito deste tema, remeto o leitor para o meu apontamento em Notas do meu rodapé de 19 de Janeiro de 2013, que a seguir transcrevo: 

As causas remotas da crise financeira internacional

Qualquer acontecimento (na vida, na política, na economia e em tudo) tem causas e consequências. E a atual crise económica e financeira internacional também teve causas, as próximas (mais conhecidas) e as remotas (pouco divulgadas e pensadas), embora os corifeus do sistema tentem apresentá-la como se de um fatalismo se tratasse, imprevisível e inevitável, sem culpados e sem tratantes. E o excesso de liquidez, ocorrido a partir dos finais dos anos setenta, é uma das causas remotas da crise. Aquele aumento de liquidez resultou de vários fatores: da enorme acumulação de capitais nos bancos dos EUA, proporcionada pela remessa de avultados lucros proporcionados pela deslocalização das indústrias para a Ásia; da então recente formação dos off shore financeiros, em diversas partes do mundo, a fim de captar poupanças dos países menos desenvolvidos; da decisão unilateral da desvinculação do dólar do padrão ouro, para poder valorizar especulativamente aquela moeda; e, também, pelo facto dos pagamentos do petróleo a nível internacional começarem a ser feitos em dólares, por imposição dos EUA (houve, nesse sentido, uma negociação do governo dos EUA com a Arábia Saudita e com outros países árabes do Golfo).
Neste novo quadro, concebido pelos arquitetos do neoliberalismo, os EUA, cujo Tesouro saiu depauperado da guerra do Vietname, reforçaram a liderança económica e financeira a nível planetário, liderança essa que agora está a ser seriamente ameaçada pela ascensão meteórica e sustentada da fulgurante economia chinesa.
Para rentabilizar rapidamente o dinheiro, e uma vez que a economia, já amputada pelo efeito da deslocalização, não podia absorvê-lo na forma de créditos às empresas, os bancos americanos conceberam então a máquina financeira de multiplicar o dinheiro: o subprime. Iniciou-se um processo gigantesco de crédito fácil e de risco, às famílias, para a compra de casa própria. Os respetivos títulos, sem que os operadores se questionassem sobre o seu valor real, entraram no jogo da roleta da Bolsa de Valores, dando origem à economia de casino. Parecia que o mundo nunca iria acabar, pois todos ganhavam dinheiro a rodos, com destaque para os bancos e os seus acionistas, que trataram de colocar os seus dividendos em lugares seguros, não fosse o céu desabar. E tinha que desabar, pois toda aquela sumptuosa riqueza era falsa, uma vez que não tinha sustentabilidade na economia real.
E o que se seguiu, já é conhecido. Falência em cadeia do sistema financeiro americano, que foi salvo pelos impostos dos cidadãos, num processo injusto e escandaloso da socialização dos prejuízos. Os acionistas dos bancos, os verdadeiros donos do mundo, ganharam mais uma vez.
Como esta crise era estrutural e não conjuntural, e como a globalização aumentou a interdependência das economias mundiais, a Europa não poderia passar incólume ao seu efeito sistémico, principalmente os países periféricos, onde o subprime foi incrementado. No entanto, existe uma diferença entre o que aconteceu nos EUA e na Europa. Por um lado, a liquidez dos bancos europeus não atingiu o nível dos seus congéneres norte-americanos, que muito beneficiaram com a internacionalização do dólar. Por outro lado, a economia europeia começou a viver um processo económico autofágico, a viver para si própria (e este é o seu verdadeiro problema). Basta dizer que a Alemanha só exporta para o exterior do espaço europeu trinta por cento do total das suas exportações. Por outro lado, na Europa, a Alemanha e a França exportaram o subprime para os países periféricos, promovendo o endividamento agressivo desses países. Tal como aqui denunciámos (ver esta hiperligação), a Alemanha, num processo inédito de engenharia financeira, e violando o Tratado de Maastricht, emitiu uma quantidade enorme de dinheiro (marcos, depois convertidos em euros), que escondeu em depósitos bancários, tendo-o utilizado, posteriormente, para forçar subtilmente o endividamento de Portugal, Espanha e Grécia (a Itália defronta-se, principalmente, com o problema da dívida interna), países que agora se encontram submetidos, por imposição da Alemanha e de alguns países ricos da UE, a uma dura, penosa e asfixiante austeridade, cujo obejetivo declarado será a promoção da redução dos seus défices orçamentais, num horizonte temporal muito curto.

Adenda: Recebi do meu sobrinho, João de Castro Mota, a seguinte observação, que acrescento aqui:
"Deixe-me só acrescentar um elemento à sua análise: para além da criação das offshores, da queda do padrão ouro, e de todos os factores que menciona, tomei conhecimento de outro elemento no excelente livro http://www.webofdebt.com/. A reserva federal americana tem andado a suportar as bolsas de valores nos EUA. De todas as vezes que parece que vai haver um "crash" na bolsa de valores, isso nunca acontece (seriamente). Por exemplo, não aconteceu com os atentados de Londres ou das torres gémeas. Nessas alturas, a Reserva Federal cria dinheiro e envia-o para fora do país (de modo a parecer um investidor exterior) e compra acções nas bolsas, de modo a parecer que a confiança está em alta". 
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Ver também aqui